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Um alvará vestido de toga

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25.03.2011
Política – Fábio Campos
Ao longo dos anos, a Coluna Política tem criticado certas decisões judiciais a respeito do cotidiano de nossa Capital. Não é incomum que magistrados assinem estranhas liminares. Na edição de ontem do O POVO, mais um caso. Vejam: ?Um posto de gasolina localizado na vizinhança da Catedral de Fortaleza ? quase às margens do Riacho Pajeú e a poucos metros da loja de fogos de artifício ? é alvo de uma disputa judicial entre o poder público e a iniciativa privada. Há quase três anos, a Secretaria de Meio Ambiente e Controle Urbano do Município (Semam) tenta embargar a construção do empreendimento, autorizada, através de liminar, por uma decisão da 3ª Vara da Fazenda Pública. Para a Justiça, a proibição do Município fere o princípio da livre concorrência e isso poderia causar prejuízos econômicos à empresa que está construindo o posto de combustíveis?. Na prática, o magistrado atropelou as leis urbanas e assumiu o lugar de prefeito. Um prefeito, diga-se de passagem, que não observa o conjunto das regras urbanas construídas ao longo de décadas.
UM BOM NEGÓCIO
Vejam com atenção mais esse trecho da reportagem: ?Esse não é um caso isolado. Existem muitos postos de gasolina construídos de forma irregular em Fortaleza, protegidos por liminar?, afirma o secretário Deodato Ramalho (Semam). ?A Semam analisa o empreendimento e sua adequação à legislação municipal para emitir ou não o alvará. No entanto, muitas empresas têm conseguido a autorização na justiça. Nós repassamos a documentação à PGM (Procuradoria Geral do Município) para entrar com os devidos recursos no Tribunal de Justiça?. Que poder o Judiciário tem para atropelar uma norma urbana e autorizar uma construção que até o sindicato que reúne os donos de postos de gasolina declara que é irregular? O problema em Fortaleza não ocorre apenas com postos de gasolina. Até grandes centros comerciais já foram construídos dessa maneira. Se tornou um bom negócio para uma parte da iniciativa privada apelar para um togado.
MIL E UMA UTILIDADES
O melhor de tudo é o argumento do juiz. Segundo a reportagem, o titular da 3ª Vara da Fazenda Pública, Francisco Martônio Pontes de Vasconcelos, argumentou que ?a norma municipal não pode se sobrepor ao princípio constitucional da livre concorrência – e que isso causaria sérios prejuízos econômicos à empresa -, o que fundamentou a concessão da liminar que intimou a Semam a autorizar o início da obra?. Como é? A livre concorrência estava sendo ferida porque a Prefeitura não concedeu a licença para construir um posto irregular? Nota-se que o argumento é bastante abrangente. Um argumento Bombril, com mil e uma utilidades. Está aí uma boa forma de acabar com a pasmaceira dos órgãos públicos que demoram meses para analisar um pedido de alvará, não é mesmo? Uma boa forma também de acabar com a cidade.