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Para coibir o abuso e promover a justiça

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22.01.2011 Opinião
Tratar sobre juros é levantar uma das mais polêmicas e antigas discussões jurídicas, econômicas e sociais. No entanto, pouco se avança no sentido de adotar alguma medida que possa, de fato, tornar os juros praticados pelas instituições financeiras compatíveis com a realidade do bolso do trabalhador brasileiro.
É impressionante como o povo deste país está desprotegido, vulnerável, sujeito a todo tipo de extorsão por parte do setor financeiro e bancário. Culpa das instituições financeiras? A culpa é também da nossa legislação que permite que isso aconteça, que protege tais transações imorais.
O Brasil é o segundo país do mundo com a maior taxa de juros nominais, perdendo apenas para a Venezuela. Aqui essa taxa chega a 10,75% ao ano. Essa situação por si só já é inaceitável. Imagine, agora, quando o cidadão brasileiro é obrigado a pagar de 10,5% a 19,9% ao mês correspondente à taxa de juros mais multa, quando se encontra em dificuldades financeiras, tendo de atrasar o pagamento do boleto ou simplesmente pagar o valor mínimo do cartão de crédito. É um absurdo!
A situação se agrava mais ainda quando o cidadão se defronta com as súmulas do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que além de proibirem os juízes de julgarem a exorbitância dos juros, os impedem de limpar o nome dos inadimplentes. Os órgãos de defesa do consumidor muitas vezes recalculam as dívidas do cliente, elaborando tabelas com juros menos desumanos. Porém, quando o cidadão apela aos tribunais de pequenas causas se surpreende quando os juízes não reconhecem tais cálculos e tais órgãos de proteção. Processos geralmente são indeferidos com a justificativa de seguirem orientação do STJ.
Tudo isso culmina na inclusão do consumidor nos serviços de proteção ao crédito. Serasa e SPC são os destinos dos nomes dos ?maus pagadores?, daqueles que não conseguem pagar juros de 20% ao mês. Como podemos definir isso, senão de crime?
Como exemplo, podemos citar uma dívida de R$ 1 mil. Com os juros praticados no Brasil, essa dívida dobra a cada quatro meses e assim sucessivamente. A quem interessa essa ciranda? Até quando o povo brasileiro será taxado de mau pagador para justificar tais taxas?
Somos contra qualquer tipo de limitação, mas somos a favor da justiça. Até hoje o enfrentamento dos absurdos juros cobrados pelos bancos nunca foi prioridade para ninguém, quer seja para o Executivo, Legislativo ou Judiciário.
Nos últimos tempos houve uma ampliação do acesso popular ao crédito, aos bens, aos juros. No entanto, nada foi feito de concreto para a criação de um mecanismo capaz de coibir o abuso por parte dos bancos e instituições financeiras. Que o governo que está iniciando agora em 2011 saia da inércia e promova mudanças profundas de apoio aos direitos dos cidadãos, coibindo a cobrança dos juros extorsivos. Que se adote uma política monetária que acabe com o sentimento de impunidade, de que o crime compensa. Isso ninguém aguenta mais.
Até quando o povo brasileiro será taxado de mau pagador para justificar tais taxas?
Vicente Ferrer Presidente do Conselho Regional de Economia
do Ceará