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EDITORIAL – Excesso de proteção

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14.02.2010 Opinião
Uma menina de 7 anos de idade foi autorizada judicialmente a desfilar como rainha da escola de samba Unidos do Viradouro no Rio de Janeiro. A decisão da juíza da 1ª Vara da Infância e da Adolescência do Rio contrariou o parecer do Conselho de Defesa da Criança e do Adolescente do Rio, que alegou o apelo sexual que caracteriza a rainha de uma bateria.
Situação quase contrária acontece no Ceará. A juíza da 3ª Vara de Infância e Juventude de Fortaleza baixou portaria, determinando expressamente que crianças de até 12 anos de idade estão proibidas de participar do Carnaval como foliãs, mesmo quando acompanhadas pelos pais. Também interditou a participação de menores até 16 anos, sem a companhia dos genitores ou responsáveis, em bailes públicos, boates, discotecas e congêneres, durante todo o período carnavalesco. Mesmo quando integrando blocos e escolas de samba especificamente criados para crianças e adolescentes, estes deverão permanecer acompanhados ou devidamente autorizados em documentos escritos por aqueles a quem cabe a responsabilidade de criá-los e protegê-los, ou ainda, na ausência deles, por deliberações de juízes das Varas de Infância e Juventude.
A rigidez das disposições da portaria foi motivo de polêmica, em decorrência da discordância formulada pela assessoria jurídica do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), no tocante à proibição explícita da presença de menores de 12 anos em festividades e desfiles carnavalescos, mesmo quando adequadamente acompanhados. Argumentou a representante da Cedeca estar a Justiça interferindo numa decisão que deveria advir somente dos próprios pais, desde que estes se façam presentes aos citados festejos.
O assunto dificilmente obterá consenso e, primeiramente, se pode dizer que a moral pública do Rio de Janeiro não é a mesma da população fortalezense que, de forma geral, não curte muito o Carnaval. Quem concorda com a proibição raciocina que é prejudicial o excesso de erotização da imagem de crianças, com a utilização de maquiagem e o uso de fantasias inapropriadas, as quais poderiam parecer apelativas até mesmo em adultos. Esse procedimento não seria apropriado, de acordo com o relatório da Associação Americana de Psicologia, às mentalidades ainda em formação, pois as crianças criam a ideia de que o sexo e a aparência física são fatores preponderantes em sua futura realização pessoal.
O Carnaval, pelas características de exacerbação emocional e sensualidade que lhe são intrínsecas, com ampla licenciosidade no tocante ao uso de bebidas alcoólicas e até mesmo de drogas, é um cenário propício para a proliferação de imagens distorcidas, em relação a tipos de comportamento pessoal e ao próprio sentido da vida. A festa tende a extrapolar, em várias circunstâncias, sua função precípua de proporcionar alegria e lazer a pessoas de todas as idades.
Todavia, a criança e o adolescente não vivem numa redoma como segregados dos problemas do mundo. Há quem diga que o excesso de proteção é mais danoso do que a própria exposição do menor, que não desenvolveria, superprotegido, mecanismos de autodefesa. Neste sentido, a proibição extrapola os limites da lei, que atribui aos pais a responsabilidade de levar os filhos para esses eventos.