Dono de blog é condenado a pagar R$ 16 mil por comentário de internauta
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- 24-11-2009
24.11.2009
Mariana Oliveira e Marília Juste – Do G1, em São Paulo
Por conta do comentário de um internauta em seu blog, o estudante de jornalismo Emílio Moreno da Silva Neto, de 33 anos, morador de Fortaleza (CE), foi condenado pela Justiça cearense no mês de julho a pagar uma indenização de R$ 16 mil.
Emílio perdeu o prazo para recorrer e, no último fim de semana, recebeu uma notificação de penhora de bens para o pagamento do valor.
O caso começou em março do ano passado, quando o universitário repercutiu em seu blog uma briga entre dois estudantes do Colégio Santa Cecília, na capital cearense. No comentário, um internauta insultou a diretora, uma freira chamada Eulália Maria Wanderley de Lima, e criticou sua atuação na intermediação da briga dos estudantes.
No segundo semestre do ano passado, a diretora da escola abriu uma ação por danos morais contra o blogueiro. Nas quatro primeiras audiências, segundo informações do Tribunal de Justiça do Ceará, o estudante compareceu e a diretora, não. Ela alegou viagens e outros compromissos profissionais.
Na quinta audiência, foi o estudante quem faltou, mas, ao contrário da diretora, não deu justificativas. Por conta disso, o juiz aceitou a ação e o condenou ao pagamento de 40 salários mínimos, o equivalente a R$ 16,6 mil na época. Emílio perdeu o prazo para recorrer e a ação transitou “em julgado” — ou seja, não há mais possibilidade de recursos.
No último sábado, dia 21 de novembro, Emílio foi notificado sobre o mandado da Justiça de penhora de bens para pagar a quantia e tem possibilidade de tentar reverter a penhora.
O estudante afirma que não tem bens para serem penhorados e alega que tentou resolver o caso “amigavelmente”. “O que eu realmente lamento é que não tenha havido um diálogo mais tranquilo, sem que houvesse a necessidade de uma ação na Justiça. Ofereci direito de resposta, apaguei de imediato o comentário. Enfim, acho que tudo isso é fruto de um grande equívoco. Lamento realmente.”
Exclusão do comentário
O advogado Helder Nascimento, que defende a diretora da escola, porém, diz que antes de protocolar a ação pediu para que o comentário fosse retirado. “Pedimos para retirar e ele não retirou dizendo que era cerceamento da liberdade de expressão. Solicitamos que informasse quem era o titular do e-mail e ele se recusou. Não podemos deixar um cliente ser violentado.”
Na versão do blogueiro, cerca de dois meses após o post e o comentário um escritório de advocacia da capital cearense entrou em contato com ele.
“Eles queriam, por telefone, que eu identificasse o autor do comentário. (…) No início achei que fosse algo muito estranho. Uma pessoa me liga e pede a identificação de um comentarista do blog. Eu não passei. Consultei o sindicato dos jornalistas do Ceará, a assessoria jurídica deles e no início de setembro chegou o mandato de citação do 11º Juizado Especial Cível.”
O estudante afirma que, embora não tenha passado a identificação de imediato, retirou o comentário do ar após o primeiro contato. “A minha intenção desde o princípio foi produzir conteúdo relevante e acima de tudo, local. Nunca tive a intenção de promover ataque nenhum a ninguém.”
Segundo Emílio, o e-mail dado pelo internauta era falso.
O advogado da freira, Helder Nascimento, diz que a Justiça avaliou o caso como “violação do direito de imagem”. “Ele (Emílio) é o responsável pelo blog e foram veiculadas matérias ofensivas à pessoa que é uma religiosa, uma freira. E isso foi interpretado como excesso na liberdade de expressão.”
Mediação
Para o advogado, o blogueiro deveria ter bloqueado as ofensas. “O blog tem mediador que faz a filtragem. Se isso existe tem uma finalidade, não está ali à toa. Ele permitiu que fosse veiculada uma ofensa a outra pessoa. (…) Embora ele não se sinta responsável, tem uma responsabilidade que extrapola o querer dele.”
O advogado avalia ainda que a internet “não é um campo ilimitado”. “Há muita discussão sobre o uso da internet. Mas há limite técnico em todas as relações, inclusive na internet.”
Emílio diz se sentir injustiçado pela sentença. “Me sinto tão vítima quanto a Irmã Eulália. Na minha inexperiência jurídica, fui usado por alguém que certamente e deliberadamente queria atacar a diretora da escola e usou meu blog e a minha boa fé pra isso. Acho importante ponderar isso. Me sinto usado por um anônimo e punido por algo que eu nunca queria que tivesse acontecido.”
De acordo com o estudante, o blog existe desde 2006 e analisa a mídia local e o cotidiano de Fortaleza.
Para o blogueiro, casos como o dele poderiam ser evitados com uma legislação clara sobre a internet.
“Quero mobilizar e sensibilizar as pessoas que militam nas redes sociais da importância de discutirmos e pressionarmos nossas autoridades para uma legislação clara e que possa amparar quem produz conteúdo na rede. Toda vez que conto essa história para alguém as pessoas ficam impressionadas. Há muita desinformação sobre tudo isso.”