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Ceará não possui dados exatos de menores abrigados

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17.08.2010 cidade
CNJ quer rever a situação jurídica de cada caso e saber o número real da população infanto-juvenil abrigada
Nem o Ceará nem o Brasil possui dados exatos sobre suas crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade e abrigados. Por essa razão, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) iniciou mobilização nacional para revisar a situação jurídica da população infanto-juvenil que vive em instituições de acolhimento. A iniciativa, informa o titular da Coordenadoria da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), desembargador Francisco Gurgel Holanda, tem o objetivo de tirar de um “limbo legal” meninos e meninas abrigados que não podem voltar para a família nem serem encaminhados à adoção.
A ação, afirma, também ajudará a preencher uma lacuna: o número real de crianças nessa situação. Dados de 2003 apontavam a existência de 80 mil no Brasil, mas um levantamento feito pelo CNJ mostrou apenas 14 mil. Em Fortaleza, são 583 vivendo nos abrigos. Para o próprio CNJ e especialistas, o número atual está, de fato, subestimado. “Essa é uma das minhas missões ao promover audiências em 26 instituições dessa natureza, sejam elas do Município, do Estado ou organização não-governamental (ONG)”.
Avaliação
Seu trabalho tem um prazo de 90 dias para terminar. Durante esse tempo, todas as segundas-feiras, visitará pelo menos duas casas de acolhimento. “Tenho uma relação de 26 abrigos para avaliar equipamentos, salubridade, segurança e justificativa para a permanência da criança ou do adolescente na instituição”, diz. Além disso, acrescenta, verifica quantos permanecem nessa condição de abrigado há mais de dois anos e o tratamento recebido.
Inclusive, ontem, a Coordenadoria da Infância e da Juventude (CIJ) do Tribunal de Justiça do Ceará verificou a situação de duas das 26 instituições que pretende visitar. Foram elas: a Missão Vida em Foco e a Casa Abrigo da Criança. As duas oferecem, na análise da coordenadoria, boas condições gerais.
Na semana passada, a Casa de Jeremias, em Fortaleza, que abriga atualmente 14 crianças com idades entre dois meses e cinco anos, foi a primeira a receber a visita da comissão. Lá, foram encontradas crianças sem registro civil.
Na avaliação do desembargador, o crack é o maior adversário das instituições que atuam na defesa da infância e da juventude. Tanto que, na Missão Vida em Foco, das sete crianças abrigadas, seis famílias têm problemas com a droga. Elas estão em processo de recuperação. “O crack é uma devastação”.
O trabalho é realizado em parceria com os juízes das Varas da Infância e da Juventude, representantes do Ministério Público, Defensoria Pública, Conselho Tutelar e secretarias de Saúde, Habitação, Educação, Assistência Social, Direitos Humanos e do Trabalho e Desenvolvimento Social.
A ação, destaca o desembargador, contribuirá para dar um lar a essas crianças, seja pelo retorno à família biológica ou sua colocação em um lar substituto por meio da adoção. “Nossa intenção é fortalecer os vínculos familiares para que os meninos e meninas possam voltar para as suas casas. A adoção é em último caso”, reafirma.
Violação de direitos
O abrigamento de crianças, explica, ocorre quando há uma violação de direito, como trabalho infantil ou abandono. O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que essa deve ser uma medida usada somente em último caso e temporária, já que todos têm o direito de crescer em uma família.
O problema é que a Justiça frequentemente “esquecia” as crianças nas instituições. Com isso, elas ficavam sem o convívio dos pais e sem a chance da adoção. “Isso deve mudar a partir deste mutirão”. O desembargador espera que a iniciativa ajude a mapear todos esses problemas no Ceará.
FIQUE POR DENTRO
Adoção
A nova Lei de Adoção, em vigor desde novembro do ano passado, prevê que crianças e adolescentes não podem ficar mais de dois anos abrigados.
A medida reforça o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que diz que o acolhimento deve ser uma medida excepcional. Meninos e meninas também devem ter a situação jurídica avaliada, no máximo, a cada seis meses. A mobilização do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deverá checar se a lei está sendo cumprida e, caso não esteja, por qual motivo.
Essa distorção fez que com que, das 80 mil crianças no Brasil abrigadas, apenas cinco mil estejam, hoje, no Cadastro Nacional de Adoção. Desse total, 57 no Estado do Ceará. Em 2009, a nova Lei de Adoção acabou com o “esquecimento” das crianças em abrigos, estabelecendo que dois anos é o tempo máximo para o acolhimento. Além disso, a Justiça tem de avaliar a situação jurídica das crianças, no máximo, a cada seis meses.
LÊDA GONÇALVES
REPÓRTER