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Bebês abandonados desafiam a nova lei

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Fortaleza 04.07.2010
A diarista que encontrou a menina recém-nascida num terreno baldio da Granja Portugal, no último dia 26, deseja ser mãe da criança, mas tem esbarrado na nova Lei da Adoção. O caso, que tem comovido a população, não é isolado. Outras famílias têm sofrido drama semelhante. A adoção de crianças expostas – abandonadas à porta, assim como em locais públicos – tem desafiado as Varas da Infância e da Juventude.
A nova lei obriga que a criança seja adotada pela primeira pessoa da fila no Cadastro Nacional, que, em alguns casos, espera de dois a três anos pela adoção. Ao mesmo tempo, a família que acolheu a criança, no primeiro momento, corre o risco de viver a dor e frustração de não poder adotar.
A própria senadora Patrícia Saboya (PDT), uma das autoras da Nova Lei da Adoção, disse, por meio da assessoria de imprensa, que acompanha o caso através das matérias do O POVO e torce para que a diarista consiga adotar a criança. Segundo ela, a lei da adoção é uma garantia para o bem-estar de crianças e adolescentes, mas alguns pontos precisam ser melhor avaliados, como este, por exemplo. O assunto já foi tema de discussão no Ministério Público do Ceará com a presença da senadora.
De acordo com a promotora da 2ª Vara da Infância e da Juventude, Marília Uchoa, há casos mais graves. Se a diarista está sofrendo por não adotar uma criança que conheceu há poucos dias, há famílias que têm convivido meses com crianças abandonadas à porta com o risco de não adotar. ?A pessoa recebe uma criança na sua casa, permanece com a criança, cria um vínculo de afetividade, se prepara para ir ao Fórum, e, mesmo assim, há juízes e promotores que não respeitam esse vínculo de afetividade. Pela lei, essa criança deve sair das suas mãos para o primeiro casal da fila de adoção?, comenta a promotora. Na avaliação dela, esse tem sido um grande entrave entre os Juizados da Infância e da Juventude no Nordeste.
?Desde o começo eu defendo que a nova lei cria um sistema de adoção que, ao meu ver, não se adequa à nossa realidade, pelo menos no Nordeste. É uma lei cruel?, assevera, acrescentando que a adoção de crianças abandonadas à porta era comum e hoje está inviabilizada pela lei. Conforme Marília explica, o risco é de que uma criança que foi abandonada e já está no seio de uma família seja retirada dessa família meramente para satisfazer a lei, ficando sujeita a um segundo abandono. ?Assim você está ferindo a Constituição, tirando o direito à dignidade dessa criança?, opina.
Ela reforça que há varas em que o Ministério Público tem adotado posicionamento muito duro, de cobrança ao cumprimento da lei. ?Casais em Fortaleza que tentam adotar dessa forma têm sofrido muito. E é um sofrimento silencioso. Eles levam aquele susto com a chegada da criança, esperam, se organizam, depois vão ao Juizado. Não sabem que estão sem a cobertura da nova lei. Ninguém espera que a lei seja contra a adoção?. Mesmo assim, ela comemora que já existem algumas decisões contrárias.