A virtualização da Justiça é positiva considerando os atuais aspectos técnicos e humanos?
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- 17-02-2011
17.02.2011 opinião
Sérgia Maria Mendonça Miranda – Desembargadora
SIM
São vários os benefícios trazidos pela virtualização da Justiça, tanto para partes e advogados como para magistrados e servidores do Judiciário. Dentre eles, podemos citar:
1) maior celeridade e economia processual, pois a morosidade da Justiça é um dos entraves apontados pela sociedade. Estima-se que cerca de 70% do tempo de tramitação de um processo é utilizado com procedimentos meramente manuais que poderiam ser automatizados. É o chamado ?tempo morto? ou ?tempo neutro? do processo, períodos em que o feito fica à espera, entre um andamento e outro, ou sofre tramitação meramente burocrática. Procedimentos como o deslocamento físico de processos, subida de petições do protocolo, realização de ?carga? dos autos, juntada física de documentos, numeração de páginas, etc, seriam superados com a tramitação eletrônica.
2) Maior transparência e publicidade, uma vez que os autos estarão disponíveis na Internet, consegue-se maior transparência nas ações do Judiciário, permitindo não só visualizar peças processuais, despachos e sentenças, mas também o tempo em que as ações acontecem.
3) Ampliação do acesso à Justiça considerando a possibilidade de ajuizar e peticionar diretamente via portal, disponível 24h, inclusive nos fins de semana e feriados, sem necessidade de deslocamento ao fórum. Uma maior comodidade para partes e advogados.
4) Maior otimização de espaço físico e redução de custos haja vista que o processo eletrônico não ocupa espaço em prateleiras, permitindo melhor aproveitamento e racionalização dos espaços físicos dos tribunais. É evidente ainda a redução de custos com a virtualização processual, pois o papel não será mais usado para compor os autos, além de dispensar a impressão e outros materiais de expediente. As vantagens para o meio ambiente também são significativas. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, estima-se que por ano no Brasil são distribuídos mais de 20 milhões de processos novos, consumindo 46 milhões de quilos de papel e 690 mil árvores, desmatando 400 hectares; e, ainda, 1,5 milhões de m³ de água (suficiente para abastecer uma cidade de 27 mil habitantes durante um ano).
5) Maior salubridade no ambiente de trabalho. Como sabido, o processo físico, ao longo do tempo de manuseio, acumula poeira, sujeira, fungos e ácaros, uma fonte direta de insalubridade. O mesmo não ocorre no processo virtual, utiliza-se só o computador.
Em suma, a tramitação eletrônica atende à exigência constitucional da razoável duração do processo, amplia a democratização da informação, o acesso à Justiça, a transparência e proporciona informação em tempo real, economia de recursos públicos, proteção ao meio ambiente, além da total governança do processo.
Fábio Ivo Gomes – Presidente da Associação dos Defensores Públicos do Estado do Ceará (Adpec)
EM TERMOS
Destacamos a importância da virtualização dos processos judiciais como uma forma de dar maior celeridade à Justiça cearense. Justiça mais célere, sociedade mais justa. Entretanto, discordamos de alguns pontos que dizem respeito à forma como a virtualização está se processando, em especial no que diz respeito ao acesso à Justiça da população mais necessitada do Estado.
Defensores públicos nos relatam que cidadãos extremamente humildes, muitas vezes até iletrados, não recebem mais qualquer informação sobre o seu processo nas secretarias de Vara; apenas um papel com uma senha para buscar informações do seu processo via Internet.
Cidadãos mais humildes e iletrados não sabem sequer o que é Internet. Muitos recorrem ao defensor público que, dentre suas inúmeras outras tarefas, passa agora o dia todo prestando informações processuais, função antes da secretaria de Vara. Uma situação que se agrava considerando o quadro extremamente reduzido de defensores e a ausência de servidores do quadro auxiliar.
Outras queixas são corriqueiras, como demora na virtualização de peças processuais e no setor de protocolo de petições enviadas, o que demandaria mais funcionários para ajudar o defensor público em tal tarefa.
Os defensores das Varas Criminais já estão preocupados uma vez que lidam com o bem jurídico mais importante: a liberdade. Com essa dificuldade para acessar o sistema, como ficarão os casos de prisões ilegais que devem ser imediatamente relaxadas? E os presos que estão cumprindo pena na Vara de Execução Penal?
Estamos cientes de que a virtualização será um marco na história da Justiça cearense e queremos apoiar o que é bom para a sociedade e para o jurisdicionado. Entretanto alguns ajustes necessitam ser realizados sob risco de penalizarmos o cidadão pobre, a sociedade e os operadores do Direito. Não podemos nos furtar de defender os interesses dos que necessitam do nosso trabalho para ter acesso à Justiça no Estado. Os mesmos estão reclamando, e muito.
Entendemos que a virtualização, uma engenhosidade dessa magnitude, poderia ter sido realizada de forma mais planejada. Não percebemos que o planejamento na implantação desse sistema tenha levado em conta a situação do jurisdicionado necessitado, infelizmente. Deixo a sugestão de termos daqui para frente um planejamento mais elaborado na implantação do sistema, levando-se em consideração os interesses dos mais diversos tipos de jurisdicionados, principalmente dos mais pobres que devem ter o mesmo peso que os ricos na balança da Justiça. Não nos esqueçamos de que por trás daqueles calhamaços de papel estão em jogo os direitos da população cearense. A celeridade não pode vir a qualquer custo.
Ezequias Leite
Juiz de Direito
SIM
A adoção dos meios eletrônicos em substituição aos meios físicos hoje não é mais uma opção administrativa. Essa ?avalanche tecnológica? se constituiu antes numa verdadeira necessidade ou exigência ao administrador, na medida em que se tem, de um lado, uma gigantesca e crescente demanda de serviços, na sua maioria essenciais e inadiáveis, e, do outro, enormes limitações de recursos materiais e humanos. Para dar vazão a essa demanda, só resta ao gestor público buscar nos meios tecnológicos disponíveis o atendimento ao princípio constitucional da eficiência administrativa.
Nesse contexto, diversos órgãos públicos adotam os instrumentos da informática como meio de melhor atender aos cidadãos em tempo razoável, de que são exemplos maiores a Receita Federal, que aboliu de vez o recebimento das declarações em papel, e a Justiça Eleitoral, que há bastante tempo processa a recepção, contagem e totalização dos votos de forma eletrônica. Principalmente com o advento da Lei 11.419/06, diversos tribunais têm crescentemente implantado o processo eletrônico, inclusive nos tribunais superiores. O Conselho Nacional de Justiça, órgão de cúpula administrativa do Judiciário, além de já utilizar sistema próprio, é um dos maiores propulsores do processo eletrônico.
Todos esses órgãos públicos têm constatado na experiência prática os enormes ganhos advindos da virtualização na tramitação dos processos, cujo maior beneficiado é o cidadão. Muito se fala nos benefícios da maior transparência e publicidade dos atos judiciais decorrente da disponibilidade integral dos processos na rede mundial de computadores; em maior celeridade, na medida em que extingue ou automatiza diversas tarefas puramente burocráticas; redução de custos com o processo e preservação do meio ambiente, beneficiando tanto o jurisdicionado como o Erário, e até mesmo o cidadão que não tenha demandas apresentadas à Justiça, com a drástica diminuição do consumo de papel e outros insumos, consequentemente da derrubada de árvores, além da redução de deslocamentos de automóveis até o órgão judicial onde ficavam os processos físicos, com os impactos ambientais daí decorrentes.
Ouso dizer que com a migração do processo físico para o eletrônico o leque de possibilidades de benefícios que se abre à frente é quase infinito, com mínimos riscos. Ferramentas que antes eram completamente inimagináveis já podem ser desenvolvidas. Amanhã essas ferramentas serão apenas o ponto de partida para a projeção de tantas outras, todas no sentido de conferir maior eficiência e agilidade ao processo, beneficiando o destinatário final da jurisdição: o cidadão.