Renovando sonhos: Programa “Um Novo Tempo” celebra 800 vidas transformadas em 2024
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- 13-12-2024
Fernanda Aires
“Às vezes, tudo o que a gente precisa é de uma mão que mostre o caminho. Aqui, eu encontrei essa mão. Hoje, eu tenho emprego, carteira assinada e, acima de tudo, tenho esperança.” As palavras são de uma mulher que encontrou no Programa Um Novo Tempo (PUNT) um porto seguro, uma outra forma de viver após o cumprimento de pena. Ela compartilhou a experiência durante confraternização natalina realizada, na tarde desta sexta-feira (13/12), no Fórum Clóvis Beviláqua (FCB).
O encontro foi promovido pelo Núcleo de Apoio às Varas de Execução Penal (NUAVEP). Além de pessoas egressas do Sistema Prisional, estiveram presentes juízes(as), servidores(as) e parceiros(as) que, juntos, celebraram os frutos de um ano de dedicação ao recomeço. Um ano de portas que se abriram, laços que se fortaleceram e vidas que, pouco a pouco, se refizeram.
Para muitos, o passado é uma sombra difícil de deixar para trás, mas para quem é acolhido pelo Programa Um Novo Tempo, o passado não é sentença, é ponto de partida. Silvana Cavalcante, supervisora do NUAVEP, vê o impacto de perto. “Avaliamos que avançamos muito neste ano. Fortalecemos parcerias e ampliamos as oportunidades para quem busca um recomeço. Pessoas que antes não tinham perspectiva e hoje estão trabalhando no TRE, na Defensoria Pública e em outras instituições”.
A fala de Silvana reflete a força de uma jornada que transformou a vida de 800 pessoas ao longo do ano. O projeto Aprendizes da Liberdade, uma das ações do Programa, certificou mais de 20 pessoas nos Ensinos Fundamental e Médio. Para quem passou anos sem perspectiva de futuro, cada certificado representa um símbolo de superação. “Não é apenas uma certificação de ensino, é a possibilidade de enxergar novos horizontes. O Judiciário, que muitos pensam ser um espaço frio, mostra aqui seu lado humano e acolhedor”, acrescentou a supervisora.
COROAÇÃO DO NATAL
A celebração de fim de ano simbolizou a colheita de um ciclo de aprendizados e transformações. Houve sorteio de prêmios e cestas básicas foram distribuídas, fruto de doações de parceiros que se juntaram ao propósito do “Um Novo Tempo”, como o Sindionibus, Mercadinhos São Luiz, Grupo Mulheres do Brasil, Organização Educacional Farias Brito, M. Dias Branco, Farmácias Pague Menos, Padaria Romana, ISM Gomes de Mattos Alimentação e Serviços, e Pinheiro Supermercados. Ainda apresentação do Coral de Libras da Comarca de Fortaleza.
O evento contou com momentos de fé e reflexão. Um dos participantes do Programa, ao falar sobre o significado do encontro, resumiu em uma frase poderosa: “Hoje eu só quero olhar para frente, reconstruir minha vida com esperança e junto da minha família”. As palavras ecoaram como uma prece silenciosa. Para quem já viveu dias de escuridão, o brilho de uma festa natalina se transforma em símbolo de renascimento.
A juíza Luciana Teixeira de Souza, titular da 2ª Vara de Execução Penal de Fortaleza, ressaltou o simbolismo do encontro. “Este espaço, que antes era visto apenas como o lugar onde se é julgado e condenado, agora é um lugar de acolhimento e transformação. Aqui, mostramos que a Justiça vai além da pena, ela se compromete com o recomeço. A confraternização é o coroamento de um ano de atividades, que incluem estudos, círculos de paz, trabalho e ações de ressocialização. É a prova viva de que a Justiça pode ser um instrumento de mudança social”.
Essa visão é reforçada pelo juiz César Belmino, da 3ª Vara de Execução Penal, que destacou a importância de se aproximar os egressos do Judiciário e da sociedade. “Aqui, dizemos a eles: ‘Voltem, porque vocês fazem parte de algo maior. Vocês pertencem à sociedade’. Isso é mais do que uma celebração de Natal. É um convite ao pertencimento. É um abraço coletivo que mostra que a Justiça não está apenas para julgar, mas para dar oportunidade de recomeçar”.
HISTÓRIAS QUE INSPIRAM
O rosto de cada participante carrega uma história. Muitos passaram anos encarcerados, mas hoje exibem o brilho de quem encontrou um novo caminho. Como o relato de uma mulher que, após cinco anos presa, encontrou apoio no Programa Um Novo Tempo e, hoje, celebra o emprego com carteira assinada. “Eu fui acolhida. Não foi fácil, mas eles me deram a mão e eu agarrei a oportunidade. Hoje eu trabalho no TRE e já estou com outra vaga garantida. Eu digo para todo mundo: quem quer, consegue. Porque aqui eles dão a oportunidade, mas você tem que querer também”.
Gleicinha Ferreira, outra egressa do Sistema Prisional, compartilhou a força de sua transformação. “Eu participei de vivências ao longo de três anos e posso dizer que minha vida mudou. Tirei minha tornozeleira, consegui trabalho no TRE e minha autoestima mudou. Descobri o amor-próprio. Agora, meu sonho é cursar Serviço Social para ajudar outras pessoas. Eu fui ajudada e quero retribuir. Quero ser a mão que eu precisei um dia”.
Para a psicóloga Socorro Fagundes, uma das responsáveis pelo acompanhamento dos egressos, o trabalho é, acima de tudo, um ato de humanidade. “Não se trata apenas de números. Cada vivência é um passo importante para a transformação. Nosso trabalho vai além da orientação e do acompanhamento, é sobre enxergar o outro e fazer com que ele também se enxergue. Aqui, realizamos ciclos restaurativos e vivências que impactam profundamente a vida dos egressos. A transformação acontece quando eles percebem que são vistos, ouvidos e valorizados”.
AÇÕES
Ao longo do ano, a equipe do NUAVEP promoveu diversas atividades, como círculos de paz, encaminhamentos de emprego e apoio para reintegração social. Entre as ações de destaque, o projeto Bem-Me-Quero, realizado em parceria com a Assembleia Legislativa do Ceará, e as oficinas de trabalho colaborativo, que demonstram o poder transformador de um olhar atento e empático.
“Muitos egressos que participaram de nossos mutirões conseguiram emprego logo depois. Recentemente, tivemos uma pessoa contratada em um supermercado após participar de uma de nossas oficinas. Isso prova que esse trabalho transforma. Quando você orienta e encaminha, você muda histórias. Todo mundo tem o desejo de ser visto”, completou Socorro Fagundes.
O Programa Um Novo Tempo não é apenas um projeto social. Ele planta sementes em terrenos antes áridos e faz florescer vidas. São 800 histórias de transformação que, neste fim de ano, se unem em um grande coral de esperança. O evento se encerrou, mas as histórias continuam. Cada cesta básica entregue foi um símbolo de solidariedade. Cada sorriso compartilhado foi um lembrete de que todos merecem uma segunda chance. Neste Natal, a Justiça brilhou com o brilho da empatia. E o que foi plantado em 2024 florescerá por muitos anos, pois onde há acolhimento, há transformação.
SAIBA MAIS
O Programa Um Novo Tempo é fruto de parcerias firmadas entre o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) e instituições públicas e privadas. Idealizado pelo Núcleo de Apoio às Varas de Execução Penal (Nuavep), tem atuado, desde 2013, abrindo portas para quem busca transformar sua realidade após o cumprimento de pena.