Justiça chega tarde para ex-prefeitos no Ceará
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- 18-01-2010
15.01.10
Eles foram acusados por suspeitas de crime contra o patrimônio público e, mais tarde, condenados em primeira instância. Com um detalhe: a sentença saiu muito tempo depois de terem cumprido, ilesos, os anos de mandato no Executivo municipal. A situação tem se repetido em vários municípios cearenses, segundo levantamento feito pelo O POVO. Da metade de 2009 para cá, pelo menos 11 ex-prefeitos foram condenados pela Justiça ou pelo Tribunal de Contas da União (TCU) após terem deixado o cargo.
Em Milagres, a 473 km de Fortaleza, o prefeito Hellosman Sampaio (PMDB) teve tempo de reeleger-se, em 2000, terminar o segundo mandato e voltar novamente ao poder em 2008 & dez anos após ter sido acusado pelo Ministério Público de superfaturar obras de uma estrada e dispensar irregularmente licitações para aluguel de carros e compra de combustível. A decisão do juiz da comarca de Milagres saiu somente em setembro do ano passado. Hellosman foi condenado a ressarcir prejuízo supostamente causado aos cofres do Município, no valor de R$ 151 mil.
O prefeito recorreu da decisão e aguarda nova sentença. Segundo seu advogado, Vicente Aquino, o peemedebista não teve direito a ampla defesa. Aquino acrescentou que há provas de que não houve superfaturamento na estrada construída. ?Os R$ 34 mil que aparecem como superfaturados foram utilizados para consertar erosão, problema que não estava previsto no projeto inicial?, argumentou. De acordo com o advogado, também há provas de que a licitação para a compra de combustível foi realizada. ?No caso do aluguel de carros, os valores estão abaixo do teto exigido para licitação?, alegou.
Em Ipueiras, a 304 km da Capital, pendências da primeira gestão do ex-prefeito Francisco Souto Vasconcelos (ex-PPB, ex-PSDB e atual PMDB) também não atrapalharam sua reeleição, em 2000. Em setembro passado, cinco anos após ?Titico? ? como é conhecido ? ter deixado o cargo, o TCU o condenou a pagar multa de R$ 10 mil, por ele não ter prestado contas, no prazo legal, de cerca de R$ 1 milhão referente a um convênio entre Prefeitura e Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), nos anos de 1999 e 2000. Procurado pelo O POVO através de ex-companheiros de partido, o ex-prefeito não foi localizado.
Conforme identificou o levantamento do O POVO, situações semelhantes ocorreram em cidades como Ibaretama, Irauçuba, Itatira, Barroquinha, Tianguá, Paracuru, Jaguaribe e Trairi (ver quadro).
Integrante da Procuradoria de Justiça dos Crimes contra Administração Pública (Procap), o promotor Luiz Alcântara avalia que essa morosidade no julgamento de crimes contra o erário estimula a impunidade. Ele lembra que, em muitos casos, a condenação já vem prescrita, ou seja, não vai gerar nenhum efeito realmente punitivo.
Como solução de curto prazo, Alcântara sugere que os tribunais de primeira instância e o próprio Tribunal de Justiça priorizem ações relacionadas a improbidade administrativa. ?Não só os promotores que investigam atos de corrupção, mas toda a sociedade fica frustrada em apenas constatar os fatos, que não geram uma punição severa, como deve ser?, protesta. (colaborou Ítalo Coriolano)
CONDENAÇÕES DESDE JULHO DE 2009
IRAUÇUBA: em julho, o Tribunal de Contas da União (TCU) condenou o ex-prefeito Antônio Evaldo Bastos a pagar R$ 418 mil por não construir o açude público Alto do Monte. As alegações da defesa não foram aceitas. Em dezembro, o TCU condenou o político novamente, dessa vez para devolver R$ 126 mil à Fundação Nacional de Saúde (Funasa). A prestação de contas referente à construção de sistema de abastecimento de água não foi aprovada pelo Tribunal. Procurado por meio de seu antigo partido, o PSDB, O POVO não conseguiu localizá-lo.
IBARETAMA: em setembro, a 15ª Vara Federal do Ceará determinou o ressarcimento de R$ 18 mil repassados em 1995 pela Funasa, para o combate à Doença de Chagas no Município à época gerido por José Urçulino de Melo. Segundo informações da Advocacia Geral da União (AGU), ele alegou que o dinheiro foi aplicado adequadamente, sem provas em sua defesa. Procurado por intermédio de seu antigo partido, o PSDB, O POVO não conseguiu localizá-lo.
TRAIRI: em junho, o ex-prefeito Henrique Mauro foi condenado pelo juiz da comarca do Município por apropriação de bens públicos e desvio de verbas em proveito próprio. O POVO não conseguiu localizá-lo. O diretor de Secretaria do Fórum de Trairi disse não poder identificar o número do processo em tempo hábil.
MILAGRES: em setembro, o atual prefeito Hellosman Sampaio foi condenado por improbidade administrativa, por superfaturamento na construção de uma estrada e dispensa irregular de licitações. O advogado alega que Hellosman é inocente e não teve direito a defesa.
IPUEIRAS: em setembro, o ex-prefeito Francisco Souto Vasconcelos, o Titico, foi condenado pelo TCU a pagar multa de R$ 10 mil, pela omissão na prestação de contas de cerca de R$ 1 milhão (referente a convênio com o FNDE) no prazo legal. Procurado por meio de ex-companheiros de partido, O POVO não conseguiu localizá-lo.
JAGUARIBE: A 15ª Vara da Justiça Federal do Ceará decidiu, em setembro, obrigar o ex-prefeito Jaime Marques Nogueira a devolver R$ 50 mil aos cofres públicos, por causa de aplicação incorreta de recursos destinados pela Funasa à implantação de unidades sanitárias domiciliares.
TIANGUÁ: em setembro, o ex-prefeito de Tianguá, Gilberto Moita, foi condenado pelo TCU a devolver R$ 265,5 mil ao FNDE, por não ter comprovado a correta aplicação dos recursos. Ele também terá de pagar multa de R$ 3 mil ao Tesouro da União.
ITATIRA: em agosto, o TCU condenou o ex-prefeito Antônio Almir da Silva a pagar R$ 107,7 mil à Funasa. Ele também foi multado em R$ 5 mil. Um mês antes, a Corte julgou outro ex-prefeito, Francisco Afonso Machado Botelho, condenado a pagar R$ 368,5 mil O ex-prefeito não apresentou a prestação de contas dos recursos federais repassados ao município, por meio de convênio firmado com a Funasa.
PARACURU: em agosto, o TCU condenou o ex-prefeito Abner Albuquerque de Oliveira a devolver R$ 35,3 mil ao Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), por ele não ter prestado conta dos recursos repassados ao município. A Corte afirma que ele não apresentou nenhum documento que comprovasse a boa aplicação da verba, limitando-se a afirmar que o objeto foi cumprido, e que a ausência de prestação de contas seria falha meramente formal.
BARROQUINHA: em setembro, a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região condenou o ex-prefeito Jaime Veras Silva Filho a pagar indenização de 500 Ufirs por causa da derrubada de coqueiros da orla da cidade, sem licença ou autorização ambiental. Em sua defesa, ele alegou que o desmatamento teve finalidade pública, uma vez que a derrubada seria imprescindível para a construção de um centro educacional e um complexo esportivo. Disse ainda que a Secretaria do Patrimônio da União havia cedido terreno.
(Jornal O POVO)