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FORO PRIVILEGIADO E AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA NO BRASIL

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04.08.2009
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RELATÓRIO E CONCLUSÕES DA PESQUISA
A pesquisa realizada pelo IBRAJUS sobre “FORO PRIVILEGIADO E AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA NO BRASIL”, realizada entre 12 de fevereiro e 2 de maio de 2009, é a primeira sobre o tema na história de nosso país. O foro privilegiado para determinadas autoridades tem por finalidade evitar que autoridades judiciárias de inferior hierarquia julguem os detentores de cargos públicos mais elevados, magistrados e membros de outros Poderes do Estado.
O foro privilegiado existe na maioria dos países. No continente europeu, a Constituição de 1974 de Portugal não prevê ação penal originária nos Tribunais, porém estabelece que os Deputados só podem ser processados com autorização da Assembléia (art. 160º, inc. 3). Na Constituição Suíça de 2006, inexiste menção explícita a foro privilegiado. No entanto, há referência à possibilidade de julgamento por uma única instância superior, no caso o Tribunal Federal, que é a Suprema Corte do país (art. 32, inc. 3). A Constituição da Itália, de 1947, prevê caber à Corte Constitucional o poder de julgar o Presidente da República pelos crimes praticados (art. 135). Os Estados Unidos da América não adota o foro privilegiado.
No Brasil o foro privilegiado existe desde a proclamação da República. A Constituição de 1891 no art. 57, § 2º, dava competência ao Senado para julgar os membros do Supremo Tribunal Federal nos crimes de responsabilidade e, ao STF, para julgar os juízes federais inferiores (art. 57, § 2º) e o Presidente da República e os Ministros de Estado nos crimes comuns e de responsabilidade (art. 59, II). Atualmente, o foro privilegiado está previsto em dispositivos esparsos da Constituição Federal de 1988 (artigos 29, X, 52, I e II, 53, § 1º, 102, I, “b” e “c” e 105, I, “a”, 108, I, “a”).
A Ação Penal Originária correspondente está regulada pela Lei 8.038, de 28.05.1990. Há, ainda, previsão na Lei 1.079, de 10.04.1950, de crimes de responsabilidade do Presidente da República, Ministros de Estado, Ministros do Supremo Tribunal Federal e outras autoridades, cujo julgamento cabe ao Senado. Mas, por serem hipóteses raras, não serão objeto desta pesquisa.
Exposto, de forma singela, o que é e onde se adota o foro privilegiado, esclarece-se que os dados de interesse desta pesquisa podem ser resumidos no seguinte:
1. Idéia e objetivos.
A idéia surgiu em razão da importância do assunto, do desconhecimento geral a respeito e da necessidade de coleta de informações para a avaliação científica do foro privilegiado. Os objetivos perseguidos são os de tentar obter um diagnóstico da realidade dos nossos tribunais referente a ações penais originárias, levantamento de dados, análise da transparência que se dá ao assunto e fornecer subsídios a todos os que se interessem pela matéria, seja através de estudos acadêmicos, seja em razão de buscarem soluções legislativas ou regulamentares.
2. Financiamento e pesquisadores
A pesquisa foi financiada pela “Associação Paranaense dos Juízes Federais – APAJUFE”, com sede em Curitiba, coordenada pelo IBRAJUS – Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário – e feita por alunos da Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC/PR. Fizeram parte da pesquisa: Vladimir Passos de Freitas, Presidente do IBRAJUS e professor doutor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná; Karin Kassmayer, Secretária do IBRAJUS, mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, advogada e professora universitária; e os alunos da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Lysandro Alberto Ledesma (pesquisador sênior, mestrando em Direito), Paula Grein Del Santoro e Willian Batista de Oliveira (pesquisadores juniores, alunos da graduação).
3. Metodologia de trabalho
Na coleta de informações utilizaram-se os seguintes métodos:
envio de ofícios solicitando informações aos Presidentes dos Tribunais com jurisdição penal e competência para as ações penais originárias, ou seja, o Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Regionais Federais (5) e Tribunais de Justiça (27). Propositadamente foram excluídos os Tribunais Eleitorais porque sua competência na matéria é praticamente inexistente;
envio de mensagens eletrônicas pedindo informações às chefias do Ministério Público com competência para oferecer denúncias criminais em crimes de ação penal originária, ou seja, o Procurador-Geral da República, Procuradores-Chefe da República Regionais (5) e Procuradores-Gerais da Justiça dos Estados (27);
pesquisa em órgãos da imprensa e sítios jurídicos.
Propositadamente, não foram feitas investigações, a respeito de procedimentos administrativos contra magistrados ou agentes do Ministério Público. Na verdade, infrações administrativas, muitas vezes, se confundem com infrações penais. Todavia, o foco administrativo extrapola o âmbito desta pesquisa e exigiria outras tantas medidas. Na verdade, um outro e novo trabalho. De qualquer forma, para quem deseje investigar esse campo, esclarece-se que raramente se encontrarão notícias nos sítios dos Tribunais. Todavia, no sítio do Conselho Nacional de Justiça a transparência é maior. As inspeções da Corregedoria-Geral têm suas atas exibidas publicamente e retratam, muitas vezes, fatos que vão além de meras infrações administrativas. Consulte-se: www.cnj.jus.br , clicar em Institucional, Corregedoria, Relatório de Inspeções.
4. Resultados das pesquisas
4.1 Pesquisa através de solicitação de informações aos Tribunais e aos órgãos do Ministério Pùblico Federal e dos Estados
A pesquisa foi feita com base em documentos solicitados a todos os Tribunais (Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, 27 Tribunais de Justiça e 5 Tribunais Regionais Federais, em um total de 34) e a todos os órgãos do Ministério Público Federal e dos Estados (Procuradoria-Geral da República 1, Procuradorias Regionais da República 5 e Procuradorias-Gerais de Justiça 27, em um total de 33). A solicitação era de registros referentes aos últimos 5 anos e, expressamente, mencionava que não se desejava saber nomes ou outros dados de pessoas envolvidas, mas apenas elementos estatísticos.
Ao pedido de informações feito a todos os 34 Tribunais com jurisdição criminal em casos de ações penais originárias 7 responderam fornecendo dados, sendo 3 federais e 4 estaduais. Ao pedido de informações formulado junto ao Ministério Público Federal (PGR e Procuradorias Regionais) e aos Estaduais (PGJs), em um total de 33, responderam 2 estaduais.
Os resultados foram os seguintes:
Os Tribunais de Justiça do RS, MG, SE e MS e os Tribunais Regionais Federais da 1ª.,4ª. e da 5ª. Regiões, responderam fornecendo dados constantes nos seus registros. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina forneceu informações sobre o seu Regimento a competência de seus órgão, registrando que às Câmaras Criminais cabe julgar Prefeitos e as demais autoridades, exceto os magistrados de primeiro grau, que são julgados pelo Tribunal Pleno. Neste caso as investigações são feitas pelo Corregedor-Geral, que poderá requisitar o auxílio das autoridades policiais. O Tribunal de Justiça do Paraná observou que aguardava regulamentação da matéria pelo CNJ. Os demais Tribunais não responderam.
O Ministério Público Federal, seja pela Procuradoria Geral da República, seja pelas Procuradorias Regionais, limitou-se a resposta por ofício da PRR da 3ª. Região. O Ministério Público do Pará respondeu fornecendo o número de denúncias contra Prefeitos Municipais. O Ministério Público de Santa Catarina informou o número de denúncias oferecidas contra autoridades que gozam de foro privilegiado, nos últimos 5 anos. O Ministério Público de Mato Grosso do Sul apresentou CD com os dados estatísticos do órgão. Portanto, o MP de 3 Estados atenderam ao pedido de informações.
Avaliação dos resultados:
c1) Tribunais: As respostas permitem que se saiba o seguinte:
I- No TJ do RS compete à 4ª. Câmara Criminal processar e julgar Prefeitos e ao Órgão Especial processar e julgar Juízes de Direito, Promotores, Vice-Governador, Deputados Estaduais e outras autoridades com direito a foro privilegiado. Não há segredo de Justiça e nos últimos 10 anos foram distribuídos 264 processos ao Órgão Especial e 330 à 4ª. Câmara Criminal. Tramitam atualmente 242 processos na 4ª. Câmara Criminal e 23 no órgão Especial.
II- No TJ do MS, segundo relatório com 61 folhas referente ao período entre 22.2.1991 e 4.3.2009, foram distribuídos 853 feitos, além de 77 à Presidência e 46 à Vice-Presidência da Corte Estadual.
III- No TJ de MG, o relatório refere-se ao período entre 2000 e fevereiro de 2009, incluindo todas as espécies de feitos, ou seja, inquéritos, habeas-corpus, ações penais, exceções, etc. Os resultados referem-se, quase na totalidade, a Prefeitos. Foram distribuídos 5 feitos em 2000 , em 2001 8, em 2002 15, em 2003 1001, em 2004 678, em 2005 363, em 2006 391, em 2007 756, em 2008 828 e em 2009, até fevereiro, 84.
IV- No TJ do Sergipe, constatou-se a existência de 7 ações penais originárias em andamento no Tribunal Pleno e 18 nas Câmaras Criminais, perfazendo o total de 25. Em termos de julgados registram-se 36 julgamentos realizados pelo Pleno e 1.090 pelas Câmaras Criminais. Não há Câmaras Especializadas.
IV- No TRF da 1ª. Região (DF) o relatório aponta para 1.189 distribuições de inquéritos e ações penais em tramitação em 4.2.2009. Não há referência sobre o cargo das autoridades, daí porque é possível concluir que estão incluídas todas que tenham direito ao foro privilegiado. Os crimes atribuídos aos denunciados são os mais variados, incluindo contra a vida, a administração pública e o meio ambiente. O TRF da 1ª. Região abrange 13 estados da Federação e sua jurisdição é exercida sobre muitas autoridades locais (Prefeitos ou Secretários de Estado), quando a vítima é a União Federal.
V- No TRF da 4ª. Região (RS) o relatório abrange o número de processos distribuídos entre 2001 e 2009, divididos por classe. No ano de 2008 foram distribuídos 58 inquéritos, 10 investigações, 7 ações penais e 26 procedimentos investigatórios do Ministério Público. Não há referência aos cargos das autoridades envolvidas.
VI- No TRF da 5ª. Região (PE) as informações são minuciosas e indicam que: a) i Tribunal não tem Turma ou Seção especializada e os casos de ações penais originárias são julgados pelo Pleno; b) o segredo de Justiça pode ser decretado na fase de inquérito, mas nas ações penais, salvo excepcionalmente, deixa de existir; c) o cadastro de antecedentes consiste, na prática, em consulta pelo nome da parte no sistema processual eletrônico (ESPARTA); d) Existem 521 inquéritos e 78 ações penais em andamento; e) nos últimos 10 anos 138 ações penais tiveram decisão de mérito.
c2) Ministério Público: As respostas permitem que se saiba o seguinte:
I- No MP de Santa Catarina, nos últimos 5 anos, foram denunciados 114 Prefeitos, 2 Juízes de Direito, 1 Promotor, 8 Deputados Estaduais e 3 Secretários de Estado. A maioria dos crimes refere-se a denúncia contra Prefeitos por infração a artigos do DLÇ 201/67.
II- No MP do Pará, nos últimos 5 anos, foram denunciados 77 Prefeitos. Não há referência a outras autoridades.
III- No MP de Mato Grosso do Sul um CD com o relatório de todas as atividades do órgão, aponta para o número de denúncias ofertadas em ações penais originárias, de 2004 a 2008. Assim, em 2008 foram denunciados 11 Prefeitos, 4 Deputados e 1 Promotor de Justiça, em um total de 15. Em 2007 foram 14 denúncias. Em 2006, 2005 e 2004, 4 denúncias. Nestes 4 anos não há especificação do cargo das autoridades denunciadas.
IV- No MP Federal da 3ª. Região (SP e MS), os processos relacionados com autoridades que gozam de foro privilegiado são da competência originária dos Procuradores do Núcleo do Órgão Especial (NOE). Somados processos e representações, as estatísticas revelam a existência de 308 em 2004, 718 em 2005, 1.016 em 2006, 862 em 2007 e 1.123 em 2008. No NOE, em 2008, foram distribuídos 724, dos quais 11 são de Deputado Estadual, 21 de Juiz do Trabalho, 231 de Juiz Federal, 441 de Prefeito, 4 de Procurador da República, 11 de Secretário de Estado e 5 Diversos. Ressalte-se que o número de procedimentos contra Juízes Federais não representa o número de agentes investigados ou processados, porque vários procedimentos podem ser contra um mesmo agente e em um processo podem ocorrer vários incidentes, como as exceções de suspeição. Maiores informações podem ser obtidas no sítio http://www.prr3.mpf.gov.br/.
4.2 Dados Pesquisa nos sítios dos Tribunais
Nas pesquisas feitas junto aos Tribunais, via sítios da internet, obtiveram-se os dados constantes nos anexos, que passam a fazer parte integrante desta ata. No entanto, para facilitar a elaboração do resultado final da pesquisa, mencionam-se alguns elementos de destaque:
Constatou-se que não há referências ao assunto em links próprios e de fácil acesso nos sites de todos os Tribunais;
No sítio do STF verifica-se que as ações penais originárias são julgadas pelo Plenário, ou seja, por todos (11) Ministros. A fase mais encontrada é a remessa dos autos ao juízo de origem, nos casos em que o agente político termina o mandato e perde a prerrogativa de foro. Há referências a 378 Ações Penais e Inquéritos contra autoridades com prerrogativa de foro. Dos 378 inquéritos e ações penais em curso no STF, 144 aguardam a realização de diligências processuais, como o cumprimento de investigações da Polícia Federal e de cartas de ordem (quando um juiz é nomeado para praticar o ato necessário ao processo. Destes, 76 encontram-se no Ministério Público Federal. Conferir em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=103916. Não foram encontrados registros de exame do mérito, ou seja, absolvições ou condenações.
No sítio do STJ constata-se que as ações penais originárias são julgadas pela Corte Especial e não pelo Plenário, exigindo-se a presença de 2 terços de seus membros. O cargo do denunciado (p. ex., Conselheiro do Tribunal de Contas de um Estado) costuma ser mencionado. É possível identificar, com facilidade, o envolvido e o crime praticado, principalmente se houver busca pelo nome. Apesar do setor de estatística ser bem organizado, não foram encontrados dados sobre ações penais originárias.
Só há Câmaras especializadas nos TJs de RS (4ª. Câmara Criminal) e SP (15ª. Câmara Criminal), muito embora não haja referência nos portais; nos outros Tribunais o órgão julgador varia conforme o Regimento Interno, por exemplo, Grupo de Câmaras Criminais, Órgão Especial, Plenário e outros.
Há jurisprudência em todos os Tribunais, que podem ser acessadas por palavras-chaves (p. ex., crime prefeito) e não pela referência ao cargo de juiz ou promotor, pois nestas hipóteses aparecem julgados relacionados com a atividade do juiz. Aparecem também com o título “Ação Penal Originária”. No TJRS a pesquisa pode ser definida pela matéria, ou seja, cível e criminal, e isto facilita a pesquisa. No TJPI não existe qualquer maneira de acesso e nem link para pesquisa de jurisprudência. Os TJs da PB e AM estavam indisponíveis para consulta quando da realização desta pesquisa. Na jurisprudência consultada há ementa e íntegra do acórdão, salvo julgados antigos.
Os cargos de Juiz, Promotor, Procurador da República, Prefeito, Deputado, Senador e outros, são geralmente mencionados na ementa.
Os tipos penais atribuídos aos Prefeitos geralmente são contra a administração pública, ambientais e de responsabilidade (DL 201/67). Juízes e membros do Ministério Público, na maioria absoluta, são crimes contra a honra. Há alguns casos, em número reduzido, de homicídio, corrupção passiva, crimes ambientais e contra os costumes.
As fases dos processos em andamento só podem ser observadas quando o pesquisador tem o número do processo. Há, todavia, informações na ementa dos acórdãos que possibilitam ao pesquisador conhecer o resultado. Para saber se houve recurso contra um acórdão, será necessário saber o número do processo. A partir dele se saberá se houve recurso especial ao STJ ou extraordinário ao STF.
A maioria dos Tribunais têm noticias institucionais, como a agenda do Presidente, cursos ministrados aos juízes, simpósios, posses e assemelhados. Alguns, como o STF, STJ e o TRF da 5ª. Região e alguns TJs como o do RS, GO e MS, dão notícias de julgamentos de competência originária. Por vezes não se acha referência na jurisprudência, mas se encontra nas notícias.
Quanto aos registros de antecedentes de autoridades com foro privativo condenadas com trânsito em julgado, nada foi encontrado. Quanto à simples existência de processo criminal, se o processo não tramitar em segredo de Justiça, é possível. No STJ é possível colher informações através consulta com o nome da autoridade processada.
Há possibilidade do Tribunal delegar aos juízes de primeira instância a prática de atos processuais em muitos Regimentos Internos (p. ex., TJSE e TJAL). Não é comum lavratura de auto de prisão em flagrante. Não há estatísticas sobre número de ações penais que chegaram ao final.
Em termos de comentários é possível afirmar que a falta de padronização dos sítios jurídicos dificulta a pesquisa, pois cada Tribunal tem uma forma de agir. As estatísticas, quando existentes, nunca abrangem ações penais originárias. A morosidade parece ser comum.
Alguns Tribunais noticiam a abertura de ação penal, porém não fornecem o resultado (p. ex., TJDF). O TJPA tem estatística sobre a produtividade dos Juízes, mas não das ações penais originárias. O Regimento Interno do TJRO tem interessante menção ao rito de ações penais originárias e também às de menor potencial ofensivo (Lei 9.099/95). O Reg. Interno do TJRS é minucioso quanto às hipóteses processuais nas ações penais originárias.
Nos TRFs a situação é semelhante à dos TJs. Em todos não há se encontram informações específicas sobre ações penais originárias. No TRF2 há menções a “crimes federais” e não aos tipos penais objeto de denúncia. Os sites do TRF2 e TRF3 admitem pesquisa, mas a cada link que se clica aparece uma página diferente, o que congestiona o sítio. O TRF4 possui bom mecanismo de ações distribuídas ou julgadas, mas sem especificar os casos de ações penais originárias. No TRF5, em geral, há informações nas suas notícias, sobre ações penais originárias, porém raramente se encontra o cargo do denunciado.
4.3 Pesquisa mediante consulta aos meios de comunicação
A primeira observação a ser feita é a de que a mídia fornece, muitas vezes, informações que não estão disponíveis nos sítios dos Tribunais e nem através de outros meio qualquer de consulta. A conclusão a que se chega é a de que jornalistas especializados em Poder Judiciário obtém informações através de contatos pessoais com servidores ou magistrados, ou simplesmente assistindo julgamentos envolvendo autoridades.
A consulta a jornais e revistas é um meio de obtenção de informações sobre ações penais originárias. A primeira observação que se faz é a de que os meios de comunicação privilegiam noticiário sobre personalidades conhecidas nacionalmente ou hipóteses de pessoas que ocupam cargos de elevada hierarquia social. Políticos conhecidos, quando envolvidos em acusações de fatos criminosos, ocupam amplo espaço na mídia. A razão está ligada ao interesse da população e, consequentemente, difusão e venda do periódico.
Nesta linha, por exemplo, notícia de prisão de 4 desembargadores e afastamento de 5 juízes na magistratura federal do Rio de Janeiro (Estado de São Paulo, 22.04.2007, C10). Ou a prisão de Presidentes de dois Tribunais de Justiça de estados da região Norte e Sudeste (Estado de São Paulo, 05.08.2006, A4, e Jornal do Brasil, 10.12.2008, A11). Da mesma forma, a abertura de ação penal contra Ministro de Tribunal Superior da República (Folha de São Paulo, 27.11.2008, A4). Em ocorrência de natureza diversa mas também de grande clamor público, registra-se notícia de um Juiz de Direito do Ceará acusado de ter matado o vigia de um supermercado (Estado de São Paulo, 05.03.2005, C6).
Por outro lado, as informações jornalísticas, muitas vezes, são acessadas através de sítios jurídicos dos jornais e não pela leitura do exemplar escrito. Assim, por exemplo, consulta via internet revela publicação de 21.02.2009, do jornal “O Globo”, fornecendo dados sobre a existência de 376 investigações originárias no Supremo Tribunal Federal.
Quanto aos sítios jurídicos de pesquisa eletrônica, há vários no Brasil. Por exemplo, o “consultor jurídico” (www.conjur.com.br), “universo jurídico” (www.universojuridico.com.br), “jusbrasil” (www.jusbrasil.com.br), “espaço vital” (www.espacovital.com.br) e “direito2” (www.direito2.com.br). Nestes sítios, todavia, há oportunidades em que notícias envolvendo foro privilegiado estão atreladas a comentários de jurisprudência, ementas ou até mesmo divulgação de eventos e livros que tratam desta temática.
Vejamos um exemplo de divulgação de notícias em um sítio jurídico. No sítio “Consultor Jurídico”, ao colocar no item “Procurar”, que se acha na página inicial, as palavras “Ação Penal Originária”, encontramos 6 folhas e 59 comentários. A leitura permite que se colham elementos sobre processos envolvendo autoridades com foro privilegiado. Por exemplo, em 16.11.2004, o Conjur noticiava que um Juiz de Direito do Rio Grande do Norte tinha sua condenação a 35 anos de reclusão, por duplo homicídio, confirmada pelo Supremo Tribunal Federal no RHC 84.903, Relator Ministro Sepúlveda Pertence. Mas, é bom que se frise, nele existem também informações alheias ao tema, como em 28.08.2006, em que se dá notícia de processos criminais de conhecido ex-banqueiro, que não tem relação com ação penal originária e que ali foi introduzido, provavelmente, porque o denunciado impetrou “Habeas Corpus”.
No mesmo sítio jurídico, colocando-se as palavras “Foro Privilegiado”, o resultado é mais expressivo, pois surgem 65 páginas e nada menos do que 644 registros. Importantes informações podem ser colhidas, pois, através do nome do envolvido, muitas vezes se poderá ter acesso aos dados do processo no Tribunal. Isto ocorre, por exemplo, no Superior Tribunal de Justiça, onde os dados são colocados com elevado nível de transparência. Para dar apenas um exemplo das centenas de informações constantes no sítio do Consultor Jurídico, em 21.03.2009 constou notícia de Deputado Federal do Estado de Rondônia que teria praticado crime ambiental, através do desmate de 1,6 mil hectares na região, Relator o Ministro Carlos Alberto Direito.
Ainda, no mesmo sítio encontram-se algumas estatísticas relativas aos processos em curso no STJ. Consta que são 26 ações penais contra os Governadores dos Estados, das quais 20 aguardam autorização da Assembléia Legislativa para ter prosseguimento. No âmbito do Poder judiciário são 25 ações penais contra Desembargadores dos Tribunais de Justiça, 17 de Tribunais Regionais Federais e 2 de Tribunais Regionais do Trabalho. No âmbito de Tribunais de Contas Estaduais, existem 32 ações penais contra Conselheiros, sendo que um único Conselheiro detém 16. Para mais informações conferir em: http://www.conjur.com.br/2009-mar-16/autoridades-foro-especial-respondem-110-acoes-penais-stj .
Outra observação interessante é que através de sítios da internet podem ser obtidas informações de natureza diversa. Por exemplo, através do sítio www.mp.pe.gov chegou-se à importante revelação de que o Ministério Público do Estado de Pernambuco, a partir do ano de 2000, ofereceu um total de 249 denúncias em ações penais originárias. Através de tais elementos poder-se-á constatar que a quase totalidade dessas denúncias foi ofertada contra Prefeitos Municipais e apurar-se quais tipos penais têm maior incidência.
5. Conclusões
A pesquisa realizada pelo IBRAJUS, com a participação de estudantes da PUC/PR, permite que se chegue a algumas conclusões:
Os Tribunais, regra geral, não disponibilizam os dados a respeito das ações penais originárias, tornando difícil uma investigação que reflita a situação real do tema no Poder Judiciário do Brasil;
As ações penais originárias vem crescendo em quantidade, seja pela existência de número cada vez maior de autoridades com direito a foro privilegiado, seja porque as apurações vêm sendo feitas com maior rigor;
Alguns Tribunais fornecem dados sobre as investigações ou ações penais originárias nos noticiários da comunicação social alimentados diariamente nos sítios da internet.
É raro que se identifique o cargo do denunciado. Mas, as ações penais contra Prefeitos Municipais constituem o mais elevado percentual de ações penais originárias e, regra geral, são processadas em Câmaras (ou Turmas) Criminais dos Tribunais, existindo Câmaras especializadas apenas nos Tribunais de Justiça do Rio Grande do Sul e São Paulo;
As ações penais contra magistrados tramitam em segredo de Justiça, seguindo o que dispõe o artigo 52, § 6º da Lei Orgânica da Magistratura Nacional para as apurações disciplinares, sendo, de regra, processadas pelo Tribunal Pleno ou Órgão Especial do Tribunal e não por uma Câmara ou Turma do Tribunal;
Na fase pré-processual, ou seja, na investigação dos fatos delituosos não existem regras fixas e claras, atuando cada Tribunal conforme o seu Regimento Interno ou a posição pessoal do Relator, sendo em alguns casos conduzida no Tribunal (v.g. Juiz) ou pela Polícia (v.g. Prefeito Municipal);
Há Regimentos Internos que prevêem a possibilidade do Relator delegar os atos de investigação ou de colheita de provas na ação penal a um Juiz de primeira instância.
As ações penais processam-se de forma lenta, seja porque os Tribunais não possuem estrutura para dar andamento aos processos (existem para julgar recursos), seja porque os fatos, geralmente, ocorrem fora da sede do Tribunal e por isso exigem a expedição de cartas precatórias ou de ordem;
A morosidade das ações penais nos Tribunais pode resultar em benefício para o denunciado, se ocorrer a prescrição, mas pode ser, da mesma forma, um ônus pesado quando ele, convicto de sua inocência, tem que aguardar anos para obter a definição do caso.
A maioria absoluta dos Regimentos Internos dos Tribunais não tem previsão para os casos de crimes de menor potencial ofensivo, ou seja, os que em primeira instância seriam da competência do Juizado Especial (Lei 9.099/95).
Os dados estatísticos sobre acusados que respondem ações penais originárias em Tribunais são praticamente inexistentes.
Nada mais havendo de interesse, encerram o presente relatório de pesquisa, que vai por todos assinado.
Curitiba, 4 de maio de 2009.
Vladimir Passos de Freitas,
Presidente do IBRAJUS e professor doutor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná;
Karin Kassmayer, Secretária do IBRAJUS, mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, advogada e professora universitária
Lysandro Alberto Ledesma, pesquisador sênior, mestrando em Direito na Pontifícia Universidade Católica do Paraná;
Paula Grein Del Santoro e Willian Batista de Oliveira pesquisadores juniores, alunos da graduação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná;