Confiança, a base da relação de consumo
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- 29-05-2009
29.05.2009 Opinião Pág.: 02
As relações jurídicas de consumo devem estar embasadas na confiança recíproca dos seus protagonistas. Essa ambivalência deve ser entendida como a lealdade, mas também a boa-fé que um deposita no outro, isto é, que o consumidor credita ao fornecedor e vice e versa. O equilíbrio, portanto, dos negócios de consumo condiz não exatamente com a paridade econômica, política, jurídica, social ou de qualquer outra natureza, de uma parte em relação à outra. Consiste, isto sim, no desejo intrínseco, precedente mesmo à realização do negócio, de cumpri-lo nos exatos termos do pacto. Mas para que esse equilíbrio se opere é preciso que o fornecedor tenha a consciência de que também ele, em determinado instante de sua existência, figurará na condição de consumidor e essa não se trata de situação rara; na verdade, será tanto mais frequente quanto mais se espraie no mercado de consumo. Sem esse reconhecimento parece incoerente cogitar-se sobre transparência e harmonia nas relações ocorridas no mercado de consumo. O fiel dessa balança, que tem em flancos opostos consumidores e fornecedores, que deve permanecer imaculadamente retilíneo, somente ocorrerá se houver fidelidade de propósitos de lado a lado. Vale dizer, quando os agentes do mercado de consumo, embora defendendo, cada qual, interesses específicos ? aparentemente antagônicos ? tenham o idêntico propósito de concluir a relação de consumo satisfatoriamente, de parte a parte. O equilíbrio, portanto, deve ser antecedente ao negócio jurídico e assim deve permanecer por todo o seu curso (v.g. contratos de trato sucessivo), de modo a se manter consolidado em bases de confiança recíproca, isto é, lealdade, boa-fé, transparência, harmonia e, em consequência, na precisa equidade de tratamento – consideradas, evidentemente, as diferenças de um em relação ao outro. Essa relação de confiança deve ter peso igual para ambas as partes. Em conclusão, o tratamento legal deferido ao consumidor não pode ser interpretado ou confundido como privilégio, senão apenas como o meio necessário para corrigir distorções fáticas, isto é, vulnerabilidade (permanente) e hipossuficiência (eventual), sempre e quando a confiança for conspurcada pelo interesse escuso.
Ricardo Memória – Promotor de Justiça