Cidadania: Certidões de nascimento são entregues pelo projeto “Caminho da Visibilidade”
- 3088 Visualizações
- 01-03-2023
Luís de Sousa Duarte recebeu o Registro Civil de Nascimento, pela primeira vez, aos 58 anos. O documento foi entregue, nesta quarta-feira (1º/03), pela equipe do projeto “Caminho da Visibilidade”, iniciativa do Poder Judiciário cearense para ajudar pessoas em vulnerabilidade social que não são registradas. “Tô em situação de rua há um tempo e não conseguia nem ter acesso a um benefício social. Agora eu sou um cidadão. Tô muito feliz”, comemorou Luís.
Ele não foi o único a celebrar a conquista da primeira certidão de nascimento. Aos 78 anos, Romoaldo de Lima Jorge sabe bem as consequências que a falta do documento acarreta. “Nunca me empreguei, só fazia bico. Trabalhava com peixe, pros outros. Não ligava pra isso”. Natural de Acaraú, ele veio morar em Fortaleza há bastante tempo e, agora, com o avançar da idade e problemas de saúde, sentiu mais necessidade de requerer o direito. “Me sinto um cidadão. Vou conseguir pelo menos me aposentar, cuidar de mim”.
Amiga da família, Diana Maria Santos Mota ajudou o idoso a solicitar o registro. “Ele não existia, né? Até pra vacina da Covid, ele só conseguiu tomar uma dose por falta de documento. Então a sensação é de alívio e gratidão pelo belo trabalho que é feito pras pessoas que não têm condições, às vezes não têm informações, então é muito bacana. O mundo precisa mais disso”.
Segundo a juíza Sônia Abreu, titular da 1ª Vara de Registros Públicos de Fortaleza e idealizadora da ação, “existe uma estatística de que 3% da população brasileira não tem registro ainda, então vamos considerar que é um número elevado em termos de população. Nosso objetivo é reduzir cada vez mais isso. E onde é que a gente tem mais dificuldade de emissão? Justamente junto a quem tem um poder aquisitivo menor ou vive nas ruas”.
COMO FUNCIONA
Dessa vez, a equipe do Poder Judiciário esteve no Espaço de Higiene Cidadã da Avenida Dom Manuel, em Fortaleza. Mensalmente, são escolhidos locais públicos onde há concentração de pessoas em situação de vulnerabilidade social, como praças e galpões da Prefeitura. Além da entrega dos documentos, há o atendimento voltado a quem deseja requisitar o documento. Após o preenchimento dos formulários, os servidores promoverão as diligências necessárias para que os requerentes recebam suas certidões originais em tempo hábil. O tempo é necessário para que sejam feitas análises junto aos cartórios e órgãos públicos para identificar a real situação cadastral da pessoa perante o Estado.
“Só em Fortaleza são dez cartórios de registro civil, fora os do Interior e até de outros estados. Então há uma certa demora, é um trabalho de pesquisa, porque existe o princípio da unicidade do registro civil, a gente só pode ter um. Às vezes a pessoa pode ter sido registrada e não sabe nem onde foi”, explica a magistrada.
O projeto também atende pessoas que precisam solicitar a segunda via do documento, como Dona Maria Lucimar Vieira Rodrigues. “Fui roubada em 1977 e, desde então, vinha pelejando. Preciso desse documento pra conseguir me aposentar. Tenho CPF, carteira profissional, aí tenho que tirar a identidade, porque sem o registro não tira, né?”. Ao receber o documento, ela se emocionou e lembrou da mãe, que faleceu “agora no dia 10 de janeiro, com 97 anos. Ela vivia perguntando quando eu ia resolver. Agora deu certo, graças a Deus!”.
As certidões entregues já estão adequadas à Lei nº 14.382, de 27 de junho de 2022, que dispõe sobre o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (Serp). Também são emitidas com registro digital, podendo ser acessadas em qualquer lugar do país por meio de um QR-Code ou pelo número do registro, dentro do Serp, conforme determinação da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
SAIBA MAIS
O projeto “Caminho da Visibilidade” foi instituído pela Portaria nº 46/2022, da Corregedoria-Geral de Justiça do Ceará, no início de agosto de 2022. A medida considera o acentuado número de pessoas em situação de rua e vulnerabilidade social, sem registro de nascimento, impedidas de ingressar em políticas públicas governamentais, inclusive serem atendidas em hospitais e beneficiadas em programas de vacinação, favorecendo a saúde coletiva.
Nesta quarta-feira, foram entregues 45 certidões e requeridas 33. Na oportunidade, a juíza relembrou o início da ação. “Fico muito feliz porque foi uma situação que nos sensibilizou muito quando vimos essas pessoas, no auge da pandemia, sem nem poder nem tomar uma vacina. Daí surgiu a ideia de fazer esse projeto que teve amplo apoio do Tribunal de Justiça e hoje é um sucesso. Nós não somos só juízes, não é só a função judicante, mas a social também”.