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72% das escolas não têm comissão contra violência

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07.10.2010 cidade
Cedeca recorreu ao Ministério Público exigindo efetivação da lei em todas as unidades do Ceará
Apenas 28% das escolas estaduais do Ceará possuem comissões de atendimento, notificação e prevenção à violência contra crianças e adolescentes, conforme obriga a Lei Estadual 13.230/2002. O fato de um aluno ter entrado armado e baleado sua colega de sala de aula, no bairro Bom Jardim, na segunda-feira passada, chama atenção para o real papel da escola: protetora ou agressora?
Em vigor há oito anos, a lei parece estar sendo descumprida enquanto estudantes sofrem com a violência constante, com briga de gangues, uso de drogas e portes de armas em escolas de Fortaleza. A lei pode ajudar a prevenir e romper com esse ciclo da violência.
“Meu filho não tem proteção alguma nem dentro nem fora da sala de aula. Na sexta-feira passada foi assaltado e ia sendo sequestrado na porta do colégio. Vou tira-lo daqui, estou com muito medo”, disse assustada, a diarista M.D., mãe de um aluno do Centro de Aprendizagem e Integração de Cursos (Caic) Maria Felício Lopes, no bairro Vicente Pinzón.
Assim como ela, vários outros pais, mães e alunos fizeram queixas. “Meu irmão já sofreu ameaça dentro do colégio; tem muita gente querendo briga no pátio da escola. Eu mesmo já vim com um canivete”, disse D.S, 17 anos, aluno da escola Deputado Manuel Rodrigues. O diretor da unidade, Olavo dos Anjos, confirma que a escola não tem comissão oficializada.
Prevenção
Conforme a Coordenação de Desenvolvimento Escolar da Secretaria de Educação Basica do Estado (Seduc), Rejane Ribeiro, das 642 escolas estaduais do Ceará, apenas 180 estão com a comissão de maus-tratos e violência oficialmente instauradas. Ou seja, 72% delas descumprem a lei.
Para a assessora comunitária Mara Carneiro, do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), há um grande desconhecimento da legislação. “A escola tem o papel de atuar na prevenção e de se relacionar com a comunidade a fim de proteger o aluno. A violência é assunto dela também”.
O Cedeca entrou com representação ao Ministério Público Estadual a fim de exigir uma maior efetivação da lei. “Algumas escolas até têm cumprido a lei, mas feito de qualquer jeito”, criticou Mara Carneiro.
Para o membro da direção do Sindicato dos Professores no Estado do Ceará (Apeoc), José Albano, são necessárias ações urgentes e efetivas, não de coerção social, mas de debate crítico sobre o problema. “A escola não pode fechar as portas. Tem muitos meninos sofrendo ameaças dentro da escola por gangues e tem diretores que nem sabem e nem fazem nada”, frisou.
Casos de violência na escola não são raros, confirmou Albano. “Tem muitas escolas barra pesada em que professores e alunos as frequentam com medo”, denunciou.
A assessoria de comunicação da Secretaria Municipal de Educação (SME) informou que todas as escolas municipais da Capital têm profissionais que passaram por formações para compor as comissões. Disse, ainda, que a Prefeitura de Fortaleza tem contado com equipes da Ronda Preventiva Escolar (Rope) e da Guarda Municipal para intervir em muitas escolas. A Ronda, garantiu, atua em todas as Secretarias Regionais.
RISCO
Professores temem retaliações de alunos
Cercas, grades, muros altos e vigilantes fazendo a proteção na entrada do Centro de Aprendizagem e Integração de Cursos (Caic) Maria Felício Lopes, no bairro Vicente Pinzón. Essa realidade do medo é enfrentada com mais coragem, pois a escola tem uma comissões de atendimento, notificação e prevenção à violência doméstica contra criança e adolescente nas escolas, segundo a diretora Maria Greoleide Alves.
Ela denuncia, entretanto, muitos profissionais têm medo de retaliação das famílias dos alunos. “Ainda temos muitos problemas de meninos que apanham dentro de casa e a gente denuncia”. As dificuldades, no entanto, estão sendo enfrentadas com a capacitação de profissionais para lidar com os casos e saber como encaminhar.
“Já sentimos que a violência diminuiu, não temos ainda alguns casos de alunos agredindo outros. Tudo está sendo enfrentado e feito a prevenção. Infelizmente, só temos controle dentro da escola, fora é mais perigoso”, disse a diretora comentando sobre como o bairro ficou estigmatizado. “Era urgente fazer algo”, enfatiza Gereoleide.
Para a articuladora de projetos da Seduc, Rejane Ribeiro, apesar de nem todas as escolas do Ceará terem comissões atuantes, elas foram orientadas a criar e estão recebendo cursos de formação e realizando ações dentro do projeto “Escola que protege”, do Ministério da Educação e Cultura (MEC). “Queríamos que bem mais escolas tivessem com comissões formadas, mas temos a consciência de que o trabalho de prevenção tem sido feito a fim de proteger os alunos”, disse a articuladora da Seduc.
A previsão é de que até o próximo dia 13 de outubro, uma série de oficinas sejam realizadas para capacitar e orientar os funcionários como atuar em casos de violência.
O projeto do MEC pretende que os profissionais sejam capacitados para uma atuação qualificada em situações de violência identificadas ou vivenciadas no ambiente escolar.
LEI 13.230/2002
*Identificar, atender, notificar, acompanhar e tomar as medidas cabíveis do ponto de vista educacional e psicossocial
*Implantar rotinas de atendimentos nas escolas para os casos de violência com crianças e adolescentes
*Notificar às autoridades sobre os casos de violência doméstica
*Prestar orientação e assistência psicológica às crianças e adolescentes vítimas
*Nos casos em que a vítima estiver correndo risco fatal, encaminhar a criança ou adolescente a um abrigo provisório
IVNA GIRÃO
ESPECIAL PARA CIDADE