SEMINÁRIO NA ESMEC DISCUTE MEDIDAS ALTERNATIVAS PARA ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE CONFLITO COM A LEI


Foi realizado na manhã desta terça-feira (29/03), na Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará (Esmec) o seminário “Justiça Juvenil Restaurativa: Outro Olhar para a Execução das Medidas Alternativas e Promoção de uma Cultura de Paz”. A promoção foi da Fundação Terre des Hommes (Tdh), em parceria com o Ministério Público Estadual (MPE). A palestra foi ministrada pelo espanhol Victor Herrero, chefe do serviço de medidas alternativas do Ministério de Justiça e Interior da Espanha.
O Seminário foi prestigiado pelo presidente da Associação Cearense de Magistrados (ACM), Juiz Marcelo Roseno. Participaram do evento diversos profissionais que trabalham com adolescentes em conflito com a lei e com projetos focados na cultura de paz. Durante a palestra, foram apresentados os conceitos e princípios da Justiça Juvenil Restaurativa (JJR), que busca a solução de conflitos, envolvendo todos os implicados no ato infracional.

ABERTURA

Promotora Antonia Lima Sousa e Juiz Emílio de Medeiros Viana falam para o público.
Promotora Antonia Lima Sousa e Juiz Emílio de Medeiros Viana preocupados com situação dos menores em conflito com a Lei.
O coordenador geral da Esmec, juiz Emílio de Medeiros Viana, fez a abertura do Seminário, destacando a dificuldade de se trabalhar com adolescentes em conflito com a lei, lembrando que até mesmo para os magistrados não é fácil dar uma solução adequada aos conflitos. “Ainda mais que, no mais das vezes, os processos que nos chegam não comportam, neles mesmos, o conflito integral. É apenas parte do conflito”.
“Enquanto julgadores, nos resolvemos os processos, mas nem sempre somos capazes de, julgando os mesmos, resolver o problema que deu origem àquele processo. Se começarmos a trabalhar com perspectivas diferentes para tentar resolver esses conflitos, talvez possamos alcançar aquele, que em verdade, é o objetivo inicial dos processos judiciários, que é promover a paz social. É nessa perspectiva que a Escola Superior da Magistratura do Ceará abre as portas para o conhecimento, estimulando eventos dessa magnitude, e esperando que ele de fato possa frutificar.”
Representando o Ministério Público Estadual, a promotora da 1a. Vara da Infância, Antonia Lima Sousa, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude (Caopij), alertou para o número crescente de jovens em conflito com a lei e condenou o sistema atual de detenção desses infratores (muitos deles de menor) que, segundo ela, não consegue diminuir o avanço da criminalidade, nem ressocializa o preso.
“Estamos [a sociedade] desenvolvendo uma cultura de internação que não resolve o problema. Estamos deixando as medidas alternativas – como prestação de serviços à comunidade, reparação de dano e pena de advertência – em segundo plano. Isso é um desabafo, mas é também um momento de reflexão para nós, que fazemos o sistema de Justiça, desenvolvermos um novo olhar, para tentar restaurar essa conduta. E assim o fazendo, que esse menino não volte ao sistema de justiça. Que a gente possa, e é esse o trabalho que nós tentamos desenvolver no Caopij, nesses próximos anos focar nosso trabalho na prevenção, cobrando essa postura junto aos setores públicos e dos que fazem a política da infância e da juventude.”

PALESTRA

O palestrante Victor Herrero
O palestrante Victor Herrero
O palestrante, Victor Herrero, falou em espanhol (com tradução simultânea) para um público atento. “Durante um ano e meio, ou dois anos, fui educador de um sistema penitenciário, que hoje está mudado, mais quando lá estive as condições eram mais duras. Eu conheci o que é a vida de um interno e o que acontece no interior do sistema carcerário”, lembrou o especialista. Disse em seguida que, depois que foi criada a Comissão de Assistência Social do Ministério da Justiça da Espanha, há uns dois anos, passou-se a questionar o porquê de uma geração inteira de jovens estarem entrando nas portas das prisões, envolvidos com problemas de droga. “Todos tinham cometido delitos, mas a pergunta que fazíamos era: cometiam delitos para manter o vício da droga ou a droga os faziam cometer delitos?”.
“A realidade é que milhares de jovens entravam pela porta do sistema penitenciário por um problema social muito significativo. A Comissão se reunia para saber o que estava acontecendo com esses jovens. Nessas discussões, vimos que esses jovens viciados que entravam no cárcere não eram grandes criminosos que tínhamos de combater e abater. Tampouco eram criancinhas coitadinhas que tinham de ser protegidas a qualquer custo. Essa é uma visões que ainda mantemos. Ou repressiva ou muito tutelar”, lamentou.
“Vimos que tínhamos que criar alternativas à prisão para esses jovens que entravam no cárcere, uma coisa que o Código Penal jamais iria prever, pois se trata de uma patologia social. É claro que alguns delitos tinham que ser tratados com internação na prisão, mas não todos. Começamos a falar dessas medidas correcionais, de alternativas para curar essa patologia social, criar meios para fazer com que esses jovens não caíssem no mundo das drogas, através de medidas de prevenção, e para aqueles que caíssem nas drogas, procuramos encontrar meios para sua recuperação através das redes de saúde, comunidades terapêuticas etc.”, afirmou o palestrante.

Quem é Victor Herrero
Especialista e mestre em Dependência de Tóxicos, integrou o Comitê de Coordenação de Assistência Social (Ministério da Justiça espanhol), entre os anos de 1985 e1999). Naquela função, foi responsável direto pelos serviços sociais penitenciários e Liberdade Condicional. Vice-presidente da Associação ARAD (Associação de Apoio ao Drogadicto, em espanhol), impulsionou a estratégia de luta contra as drogas, com a colaboração com o Ministério da Justiça e do Plano Nacional de Drogas.
Fez intercâmbios importantes de informações e experiências com o Poder Legislativo que permitiram gerar alternativas para as apreensões de infratores dependentes de drogas, com prioridade para menores de 18 anos. Foi diretor geral da Assistência Social espanhola (1989 a 1995). Nessa função, ele foi diretamente responsável por todos os Centros e Serviços Correlatos a proteção de infratores menores de 18 anos, Terceira Idade, Mulheres (políticas de igualdade), Pessoas com mobilidade comprometida, Minorias Étnicas, Exclusão Social e outros.

JUSTIÇA JUVENIL RESTAURATIVA

A Justiça Restaurativa é uma abordagem recente na área do direito que busca a solução de conflitos. Ela se baseia num procedimento de consenso, em que vítima e ofensor, e, quando apropriado, outras pessoas ou membros da comunidade afetados pelo conflito participam coletiva e ativamente na construção de soluções para a cura das feridas, dos traumas e perdas causados pelos conflitos.
O desafio colocado é promover novos modelos para o enfrentamento de conflitos, bem como incentivar uma justiça comprometida com os desejos da comunidade. O foco principal de Tdh Brasil para os próximos anos é reforçar este movimento e proporcionar a difusão do paradigma da Justiça Juvenil Restaurativa (JJR), contribuir para buscar alternativas eficazes para prevenção dos conflitos e de atendimento ao adolescente em conflito com a lei.
Criada em 1960, a Fundação Terre des Hommes é uma organização não-governamental suíça, que tem como missão essencial a ajuda à infância. Ao longo do tempo, vem agindo com tenacidade e eficácia, buscando sempre melhorar de maneira duradoura a condição de vida de crianças e adolescentes mais vulneráveis.