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Princípios do Direito não evitam brigas entre juristas

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26.04.09
Por Celso MoriA perplexidade da sociedade brasileira, e especialmente da comunidade jurídica, em razão dos recentes incidentes ocorridos no Supremo Tribunal Federal não deve ser uma experiência estéril, que se reduza à constatação do desapontamento.
O episódio desafia análises que possam efetivamente contribuir para o aperfeiçoamento das instituições.
Embora nem todos tenham consciência disso, grande parte da perplexidade decorre do fato de conflitos pessoais dessa magnitude ocorrerem justamente no Supremo Tribunal Federal, onde têm assento juristas escolhidos entre os mais destacados e notórios do país. Ninguém põe em dúvida a excelência dos currículos dos atuais integrantes da Corte.
Teoricamente, entre grandes juristas que se reúnem exclusivamente para dizer o Direito, não deveriam ocorrer trocas de ofensas pessoais. Em primeiro lugar, porque o Direito é a ciência do relacionamento. É a ciência dos regramentos de conduta que permitem a vida em sociedade, assegurados, entre outros, os atributos inerentes à personalidade, a proteção da honra e da dignidade pessoal, o direito à manifestação livre do pensamento. Pontos de vista divergentes sobre teses de Direito, ou mesmo sobre a aplicação do Direito a casos concretos são pressupostos da atuação colegiada de juristas e juízes, e nunca poderiam ser causa de atritos pessoais. A dialética, a tese, a antítese e a síntese são inerentes à estrutura do processo.
Portanto, a sociedade percebe como paradoxal o fato de que, na mais alta corte de Direito do país, os princípios e as regras de Direito não sejam suficientes para evitar atritos entre os seus próprios integrantes. Parte da frustração decorre da crua constatação de que se o Direito não servir nem mesmo para disciplinar a conduta dos que o cultuam e fazem dele a razão de ser de suas vidas, de pouco servirá para pautar o comportamento do cidadão comum.
Não se exige nem se espera que ministros do Supremo Tribunal Federal, ou profissionais de qualquer outro tribunal ou órgão judiciário, sejam semideuses que devam superar toda fragilidade da condição humana. Mas, exatamente porque não são semideuses, também não se espera que sobreponham a dimensão das seus personalidades aos limites de suas nobres e sacrificadas atribuições. É razoável a expectativa de que estejam muito acima da média da população, não apenas nas virtudes e no conhecimento jurídico, como no que se refere a comportamentos que possam violar direitos de outros.
Quando um jovem e inexperiente advogado, ou algum advogado mais agressivo insere em suas petições expressões que desbordam da discussão jurídica e incidem ou resvalam na crítica pessoal, os juízes mais atentos, com fundamento na legislação processual, determinam que as expressões ofensivas sejam riscadas da peça processual. Quando estabelece regras de comportamento que proscrevem as críticas pessoais, o Código de Processo impõe que as discussões processuais se mantenham estritamente na esfera das teses, teorias e práticas jurídicas.
Todo cidadão tem direito de expressar seu pensamento, e até prova em contrário tem a seu benefício a presunção de que o faça de boa fé. Com maior razão, um ministro do STF tem o direito, como relator de um caso ou na simples manifestação de seu voto, de ser havido pelas partes, pelos advogados, e especialmente pelos seus pares como no exercício regular e digno de um direito.
O juiz não tem só o direito. Tem o dever funcional de expressar a sua convicção. E tem o correspondente direito de não ser criticado, ou pessoalmente ferido nos seus atributos de personalidade ou na sua dignidade pessoal, pelo fato de assim se expressar. Quando um juiz diz a outro, em sessão de julgamento, que o colega não está colocando os fatos “em pratos limpos” parece se evidenciar violação dessa presunção de boa fé. É do notório saber popular e jurídico que não colocar as coisas em pratos limpos, quando se tem a obrigação profissional de fazê-lo, significa tergiversar sobre os fatos. Há, aí, uma acusação implícita de má fé.
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