Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas
A Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas – VEPMA, foi a primeira Vara especializada desta matéria no Brasil, criada pela Lei 12.862, de 25/11/1998, com o objetivo de promover a ressocialização de pessoas que transgrediram as leis, contribuindo para a humanização do cumprimento da pena. Com enfoque restaurativo e em consonância com a Resolução nº 288 de 2019 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, a VEPMA realiza o acompanhamento de pessoas em cumprimento de Alternativas Penais da comarca de Fortaleza.
A VEPMA pauta sua atuação na busca para a restauração das relações e a promoção da cultura de paz, a partir da responsabilização com dignidade, autonomia e liberdade, tendo como principal competência o acompanhamento das pessoas com Penas Restritivas de Direitos e em cumprimento de Acordos de Não Persecução Penal. Tais práticas objetivam a restauração dos indivíduos, sua reinserção social e contribuem para a resolução dos fatores geradores da infração, trazendo, portanto, benefícios para o sujeito, para sua dinâmica familiar e a todos da sociedade, atendendo também às questões legais, como parte do processo de responsabilização.
O trabalho envolve ações de cunho socioeducativo, para tanto são realizados: Grupos Reflexivos (Grupo Diálogos; Grupo Cenários: construindo Novas Perspectivas) para pessoas em alternativas penais; Círculos de Paz, para cumpridores de penas que respondem especificamente a crimes de trânsito e pessoas sentenciadas por tráfico de drogas. A participação nas atividades de grupos reflexivos e círculos de paz é computada como horas cumpridas das penas/medidas alternativas, de acordo com a duração de cada atividade, geralmente a duração é em torno de 4 horas.
O trabalho em grupo é uma prática que favorece a identificação demandas trazidas pelas pessoas em cumprimento de penas alternativas e o elencamento de prioridades em torno de suas realidades de vida, por meio de reflexões sobre o cotidiano e as formas de enfrentamento das situações apresentadas. Além de propiciar um ambiente de troca de experiência, onde seus participantes têm maiores possibilidades de vivenciar relações horizontalizadas e mais solidárias em uma mesma atividade socioinstitucional. Ademais, visam aproximar a vida desses sujeitos para que as potencialidades deles possam ser desenvolvidas, de acordo com suas necessidades, com o propósito de emancipá-los e ascendê-los socialmente.
No decorrer de nossa história, realizamos parcerias/convênios com outras instituições e com profissionais voluntários, que possibilitaram o desenvolvimento de práticas restaurativas, as quais representam uma importante ação no apoio aos cumpridores de penas alternativas. Atualmente são mais de 200 instituições parceiras o que nos possibilita a realização do acompanhamento de milhares de pessoas, objetivando analisar as condições socioeconômicas; familiares; culturais; assim como, situação de moradia; empregabilidade; escolaridade; saúde; inserção na comunidade e possíveis situações de vulnerabilidade, a fim de identificar as dificuldades enfrentadas pelas pessoas em alternativas penais no efetivo cumprimento da pena imposta. Atualmente, contamos com mais de 3000 pessoas em cumprimento de penas restritivas de direitos, prioritariamente com as penas de Prestação de Serviço à Comunidade ou a Entidades Públicas (PSC), Limitação de Fim de Semana (LFS) e Prestação Pecuniária.
Tais parcerias nos possibilitam o desenvolvimento de alguns projetos, entre os quais destaco:
O Projeto de Escolarização Penas Alternativas é uma iniciativa educacional desenvolvida pela Vara de Penas e Medidas Alternativas da Comarca de Fortaleza, em parceria com a SEDUC através do Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA) Paulo Freire, aos sábados (13h às 18h) e domingos (8 h às 13h), totalizando 10 horas/semanais a serem computadas para a pena de Limitação de Fim de Semana. Os alunos são pessoas em conflito com a lei que em vez de cumprir suas penas com a privação de liberdade em estabelecimentos prisionais são encaminhados a frequentar a escola nos finais de semana, sendo assim uma oportunidade de ressocialização por meio da educação. A iniciativa é voltada para pessoas que cometeram crimes de menor potencial ofensivo e, por isso, puderam ter as penas privativas de liberdades substituídas por penas restritivas de direitos.
O projeto tem como objetivo proporcionar ao cidadão a reintegração de seu direito à educação através da oferta gratuita de cursos e exames aos jovens e aos adultos que são encaminhados ao CEJA Paulo Freire pela Vara de Execução de Penas Alternativas, propiciando oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, nível de experiência e escolarização. São objetivos específicos do projeto:
I) Ofertar a escolarização aos jovens e adultos através cursos de Ensino Fundamental e Médio e exames, respeitando as características, aptidões, disponibilidades e necessidades dos alunos;
II) Fortalecer a confiança do educando na sua capacidade de aprendizagem, reconhecendo e valorizando os seus conhecimentos adquiridos pela vivência em sociedade, elevando, assim, a sua autoestima através da educação como meio de desenvolvimento pessoal e social;
III) Proporcionar o domínio e habilidades no ato de ler e escrever, base necessária ao desenvolvimento do pensar, refletir, interpretar e compreender a realidade social na qual os educandos estão envolvidos;
IV) Desenvolver as habilidades de contar, calcular e medir, visando o desenvolvimento das estruturas lógicas do pensamento pelo domínio e ampliação dos conteúdos que estimulam o raciocínio de forma ordenada;
V) Trabalhar e internalizar os valores éticos, políticos e estéticos, despertando as sensibilidades sobre as variedades de usos, costumes e tradições das sociedades bem como visualizar e compreender os fenômenos físicos, biológicos, ecológicos, sociológicos, filosóficos, geográficos, históricos, políticos, religiosos frequentes em nosso cotidiano;
VI) Motivar e oportunizar o início e continuidade de estudos dos educandos através de exames e estratégias de classificação, aproveitamento de estudos, diagnósticos e encaminhamentos para continuidade estudos na EJA semipresencial quando sua pena for finalizada antes da conclusão das etapas do ensino fundamental e médio previstas no projeto;
VII) Incentivar a oportunidade de conclusão dos Ensinos Fundamental e Médio através da inscrição no Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) e Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).
INGRESSO E POSICIONAMENTO DOS ALUNOS NAS TURMAS
Considerando a especificidade do público do projeto e suas necessidades educacionais, o ingresso e o posicionamento escolar dos alunos na etapa correta ocorre da seguinte forma:
a. Os educandos são encaminhados através de ofício da Vara de Penas Alternativas da Comarca de Fortaleza;
b. Essas pessoas passam por uma avaliação diagnóstica e são encaminhadas para os ciclos específicos conforme seu nível de experiência, conhecimentos e comprovação de escolaridade anterior. Quando se trata de candidatos aos anos finais do ensino fundamental e ensino médio sem comprovação de escolaridade anterior, os mesmos são encaminhados para realização de exames, de acordo com sua experiência, desempenho e necessidades de aprendizagem, a fim de posicioná-los na etapa de escolarização adequada a seu desenvolvimento.
c. Os jovens e adultos que trazem comprovação de escolarização anterior nos anos iniciais do ensino fundamental, mas que apresentam defasagem de conhecimentos básicos de leitura, de escrita e nas operações elementares da Matemática, recebem reforço para ampliação de domínio das habilidades acima citadas como preparação para ingressar nos anos finais do ensino fundamental; d. Comprovando a condição de progresso nos estudos realizados, o jovem ou adulto é matriculado nos anos finais do ensino fundamental.
Trata-se de um programa que tem por objetivo ajudar pessoas a vencer seus vícios, traumas emocionais, maus hábitos e comportamentos destrutivos. Quem participa do programa é orientado a percorrer uma jornada de 12 passos com enfoque restaurativo. Algumas das áreas de restauração são:
Drogadição
Alcoolismo
Depressão e Luto Sexualidade
Problemas Emocionais
Ira/ Raiva
Codependência Emocional
Transtornos alimentares
Compulsão por compras
Codependência para familiares de dependentes químicos.
As pessoas em Alternativas Penais são encaminhadas para cumprimento da pena de Limitação de Fim de Semana, por meio da inserção no programa descrito, uma vez que não dispomos de Casa do Albergado. Após o atendimento técnico, verificado a possibilidade de encaminhamento, muitos assistidos evidenciam sofrimento emocional advindos com as consequências de uma Ação Penal, notadamente os que cometem crimes de trânsito, entre outros.
O Instituto das Alternativas Penais não estagnou, passou por mudanças legislativas, estruturais e afins, assim como criaram-se postulados, princípios e diretrizes elencados no Manual de Gestão para as Alternativas Penais, e, atualmente constituem-se como mecanismos de intervenção em conflitos e violências, diversos do encarceramento, no âmbito do sistema penal, orientados para a restauração das relações e promoção da cultura da paz, a partir da responsabilização com dignidade, autonomia e liberdade.
A aplicação das alternativas penais é vista por especialistas e por diferentes instituições, a exemplo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como forma de reduzir o encarceramento massivo, refletido na conjuntura sócio-histórica da sociedade brasileira. Há a necessidade de fazer frente a essa lógica punitivista, por meio de um trabalho que articulado entre os sistemas de justiça e poder executivo. É nesse sentido que a VEPMA vem conjugando esforços, ou seja, articulando redes de apoio com o fito de promover uma justiça célere e efetiva.
A Secretaria de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos - SPS, por intermédio dos Centros de Inclusão Tecnológica e Social – CITS recebem pessoas com alternativas desde 2020, a partir do acolhimento destas, para inclusão em capacitação e prestação de serviços, portanto formalizarmos Termo de Cooperação Técnica, que segue com minuta em anexo.
Convém ressaltar que essa parceria tem como objetivo a cooperação técnica e administrativa entre os partícipes, com a disponibilização de vagas, pela SPS, nos cursos de qualificação e prestações de serviços executados nos CITS, pelas pessoas em alternativas penais encaminhados pela VEPMA, considerando a reinserção social destes, promovendo oportunidades e valores humanos que fundamentem uma sociedade democrática, justa e solidária.
Contamos, também, com o Projeto de apoio aos autores de violência doméstica (NUAH), que promove atividades socioeducativas e grupos reflexivos numa perspectiva restaurativa. O NUAH foi um projeto pioneiro no Estado do Ceará e funciona nas dependências da VEPMA, em parceria com o Juizado da Mulher de Fortaleza, Secretaria de Administração Penitenciária, Defensoria Pública Geral do Estado do Ceará, Procuradoria Geral de Justiça do Estado do Ceará, Núcleo Estadual de Gênero pró-Mulher e Diretoria do Fórum Clóvis Beviláqua, atualmente por meio do convênio sob o nº 08/2022. A criação deste Núcleo proporcionou o desenvolvimento de uma prática específica para o homem, composta por ações dirigidas a pessoas que já praticaram crimes e violências diversas à mulher, visando atingir direta e indiretamente as formas e qualidade de vida de mulheres que estão em situação de violência e, sobretudo, a família.
O NUAH existe desde 2010, mas passou por uma pausa em face da pandemia. Retomamos os trabalhos em 2022, principalmente após convênio com a Universidade Federal do Ceará (UFC), por meio do projeto Renova do Laboratório de Análise Experimental do Comportamento Ceará (LACCE), que trouxe uma grande força para o retorno do Núcleo, pois ele trabalha as habilidades sociais de homens que praticaram violência contra a mulher, Além dos Grupos Reflexivos e Círculos realizados com outros parceiros.
Cabe ressaltar que as atividades dos grupos de reflexão e sensibilização e oficinas socioeducativas são desenvolvidos com o intuito de afastar os homens do contexto da violência e modificar padrões socioculturais de comportamentos sexistas. Trata-se de intervenção, a partir da perspectiva de gênero, em que o principal objetivo é a tomada de consciência de responsabilidade por parte dos homens autores de violência contra a mulher que chegam ao grupo através de encaminhamento do Judiciário. Além disso, cabe pontuar que o NUAH proporciona um trabalho multidisciplinar, reflexivo e preventivo, onde os homens recebem atendimento diferenciado, que não exclui a responsabilização pelo ato praticado e busca através da reflexão sobre suas atitudes para ter uma visão diferente e reconstruir um novo caminho através de práticas não violentas. É um trabalho especializado e uma forma de combater a violência contra a mulher por promover uma mudança de paradigma.