O desafio da nova Lei da Adoção
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- 10-08-2009
10.08.2009 Fortaleza
Lucinthya Gomes lucinthya@opovo.com.br
Cerca de 570 crianças e adolescentes vivem em abrigos em Fortaleza, sem o direito de pertencer a uma família. Do total, 12% estão disponíveis para adoção, o que corresponde a 74 meninos e meninas. Nos abrigos, outros 88% ainda têm vínculos com a família de origem e esperam a Justiça definir se voltam para casa ou se vão ser entregues para adoção. Sancionada pelo presidente Lula no último dia 3, a Nova Lei da Adoção chega como um alento para estas crianças e adolescentes, prometendo reduzir o tempo de permanência em abrigos e dando mais celeridade às adoções. A ideia é vencer a burocracia. Os dados são do Juizado da Infância e da Juventude.
Quando a Nova Lei da Adoção entrar em vigor, em cerca de 90 dias, a Justiça terá um prazo de dois anos para definir a situação da criança e do adolescente: ou volta à família biológica ou é encaminhado para a adoção. O objetivo é garantir que a situação de abrigo seja, de fato, provisória e excepcional, como determina o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). ?Muitas das crianças que estão em abrigos estão esquecidas. Sequer têm processo na Justiça para definir a situação delas de retornar à família biológica ou de ir para uma família substituta?, reclama o diretor da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), juiz da Infância e da Juventude em Recife, Élio Braz.
De acordo com ele, o estabelecimento do prazo é uma cobrança ao Poder Judiciário, para evitar que a criança permaneça cinco ou até dez anos em abrigo, e, em alguns casos, sem nem ter um processo. O oficial de projetos do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Rui Rodrigues Aguiar, lembra o caso de um menino do Interior que vivia com uma tia e sofreu abusos dentro de casa. O menino fugiu para Fortaleza e ficou vários anos na rua, até que foi abrigado. ?Foi localizada uma pessoa para adotar o adolescente, mas o processo (de destituição do poder familiar) não se concluiu. Então, o menino virou adolescente, adulto e não foi adotado?, lamenta.
Para ele, a fixação de um prazo máximo de permanência da criança no abrigo é muito importante, pois acelera o processo de adoção. Outra novidade da lei é que cada criança e adolescente abrigado deverá ter sua situação reavaliada por equipes multidisciplinares, a cada seis meses no máximo, para que o juiz possa decidir sobre o seu destino. ?Uma vez que a criança está no abrigo, a cada seis meses deve ser feita reavaliação da situação, sempre buscando a recolocação no seio familiar ou na família substituta?, explica Aguiar.
Além de beneficiar crianças, a Nova Lei promete amenizar o drama de quem deseja adotar. De acordo com o Juizado da Infância e da Juventude, existem 170 pessoas habilitadas na fila de espera para adotar uma criança. Do total, 82 são casais cadastrados. Os demais são solteiros. No momento em que a cada criança passa por um acompanhamento permanente, os processos de destituição do poder familiar ocorrerão com mais agilidade, disponibilizando mais meninos e meninas para adoção.
Casais homoafetivos ainda não foram contemplados pela nova lei. Para adotar, os casais devem ser casados civilmente ou manter união estável. Segundo alguns especialistas, a Constituição reconhece como união estável só aquela constituída por homem e mulher, o que impediria a adoção por casais homoafetivos. No entanto, o juiz Élio Braz destaca que a lei não proíbe e já existem decisões judiciais no Brasil que deferem adoções a estes casais. ?Quando dois homens e duas mulheres recebem uma criança em adoção, o Estado está dizendo que esta criança terá suas garantias constitucionais exercidas por essas pessoas. Cor, sexo não interessam para a adoção?.
LEIA AMANHÃ
>A nova Lei da Adoção traz avanços, mas também gera desafios. Especialistas comentam o que é preciso mudar para que a lei seja efetivamente cumprida.
NOVAS REGRAS
PARA GESTANTES
>O Que diz a lei?
As gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção têm direito à assistência psicológica durante o período pré e pós-natal. Além disso, elas devem ser obrigatoriamente encaminhadas à Justiça da Infância e da Juventude.
>O que muda?
Esta prática é fundamental para evitar que mães desesperadas deixem essas crianças em locais inadequados, colocando em risco a própria vida e a dos recém-nascidos. É uma decisão difícil de ser tomada e, nesse momento, o que a genitora precisa é de acolhimento e orientação. Além disso, o encaminhamento da mãe ao juizado – procedimento que passa a ser obrigatório – ajuda a evitar aproximações indevidas com pessoas interessadas em adotar. Assim, vai ser possível privilegiar pessoas que já estão na fila de espera para adoção.
PARA CRIANÇAS ABRIGADAS
>O que diz a lei?
Toda criança ou adolescente que estiver em abrigo terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada seis meses, para que o juiz possa decidir sobre a possibilidade de reintegração familiar ou disponibilização para adoção, com base em relatório elaborado por equipe interprofissional ou multidisciplinar.
>O que significa?
Antes, não havia um mecanismo de controle periódico. Era fundamentada apenas a entrada no abrigo e a saída. Com a nova regra, a situação da criança ou adolescente deverá ser avaliada permanentemente.
>O que diz az lei
A permanência da criança e do adolescente em abrigo não se prolongará por mais de dois anos.
>O que significa?
Antes, não havia tempo máximo para criança permanecer no abrigo, o que resultava em demora para a solução de algumas situações. A fixação de um tempo máximo – e a obrigatoriedade de justificar quando o prazo for superado – fará com que o direito de viver em uma família, biológica ou substituta, seja privilegiado em detrimento da permanência em uma instituição.
PARA CANDIDATOS ADOÇÃO
>O que diz a lei?
Para adoção conjunta, os adotantes devem ser casados civilmente ou manter união estável, comprovada a estabilidade da família.
>O que significa?
Casais homoafetivos ainda não foram contemplados pela nova lei. A Constituição reconhece como união estável só aquela constituída por homem e mulher. No entanto, existem decisões judiciais que superam esse entendimento e deferem sim adoções a pessoas em união homoafetiva.
O QUE DIZ A LEI?
A habilitação de pessoas estrangeiras ou pessoas que moram fora do país que têm interesse em adotar terá validade máxima de um ano, podendo ser renovada.
O QUE SIGNIFICA?
Após serem considerados aptos pela Justiça de seu país e do Brasil, os estrangeiros só têm um ano para efetivar a adoção.
FONTE: Novas regras para a adoção – Guia Comentado
E-MAIS
> A Nova Lei da Adoção foi sancionada pelo presidente Lula em 3 de agosto e no dia seguinte foi publicada no Diário Oficial da União. A partir do dia 4 de agosto, 90 dias após a publicação, a lei entra em vigor.