Conteúdo da Notícia

Prerrogativa podada?

Ouvir: Prerrogativa podada?

Opinião Pág.06 11.09.09
Uma expressiva corrente jurídica e política teme que decisão em andamento no STF fira prerrogativa constitucional do executivo na representação da soberania nacional
O julgamento sobre o refúgio político do ex-ativista italiano Cesare Batistti, pelo Supremo Tribunal Federal, que dividiu a corte meio a meio (e que foi suspenso por pedido de vistas de um dos ministros) repercute nos meios políticos por envolver modificação profunda no exercício da representação da soberania nacional pelo Executivo ? algo jamais visto no País.
Independentemente do juízo que se tenha a respeito da pessoa-alvo da ação do Estado italiano, e de seus engajamentos políticos, ou não, o que está em jogo – segundo o constitucionalista Paulo Bonavides -, é o reconhecimento da prerrogativa do Executivo, como representante-mor da soberania nacional, de decidir sobre questões que ponham frente a frente o Estado soberano do Brasil e outro Estado soberano, estrangeiro. A autoridade constitucionalmente encarregada de definir posições nessa área é o Executivo ? o presidente da República e o delegado deste, o ministro da Justiça (que teria agido corretamente, segundo o constitucionalista). De acordo com esse entendimento, já consagrado, não seria da competência do Superior Tribunal Federal adentrar nessa esfera política, cabendo-lhe apenas aferir a adequação dos procedimentos administrativos às normas inscritas.
Para essa expressiva corrente constitucionalista ? e política – a concessão de refúgio é ato político (não jurídico) cabendo ao Executivo avaliar se, do ponto de vista do interesse nacional, se interessa acolher, ou não, a solicitação de alguém que busca a proteção do Estado brasileiro, por razões humanitárias ou políticas, segundo leitura própria do Executivo. O critério aí utilizado é político, cabendo ao Executivo discernir a situação, fazendo a leitura política que lhe diz respeito como detentor da representação da soberania nacional. Ou seja, se a decisão atende à linha programática de sua política externa. Não caberia, assim, ao Judiciário interferir na avaliação política feita pelo Executivo nessa área.
Agindo assim foi que, historicamente, o Brasil deu abrigo, tanto a ditadores de direita (expulsos do poder pela insurgência dos cidadãos oprimidos) quanto às vítimas de perseguições por parte destes, sem levar em conta a filiação ideológica de nenhum.
Outro questionamento posto é se um tribunal brasileiro deve aceitar uma representação de um Estado estrangeiro contra uma decisão interna e soberana do próprio Estado brasileiro.
Teme-se pela caput diminutio da autoridade do Chefe de Estado, e sua fragilização perante a correlação de forças, no plano internacional. Além desse fator político externo, haveria o interno, por dar ensejo ? segundo essa corrente – a um possível conflito de poderes, e o sentimento por parte do Presidente da República – e das correntes que apóiam a interpretação tradicional – de que a plenitude do exercício do mandato recebido da soberania popular possa ser constrangido.